sábado, 24 de março de 2012

24 de março


Na madrugada do dia 24 de março de 1976 Isabelita Perón foi derrubada por um golpe militar. A viúva de Perón era completamente despreparada e fez um governo desastroso. Mas as eleições estavam marcadas para aquele ano. Os militares não quiseram dar a oportunidade de mais um governo peronista e acharam melhor iniciar um verdadeiro reinado do terror.
Não gosto muito dessa coisa de discutir qual ditadura foi mais violenta. Isso abre margem para dizerem que a ditadura brasileira "não foi tão ruim" ou até que foi uma "ditabranda", como disse a Folha de São Paulo. Mas o regime que os argentinos conheceram a partir daquela maldita madrugada realmente se empenhou em bater recordes.
Não contente com as violações de direitos humanos regulamentares das ditaduras latino-americanas, o regime argentino se empenhou no quesito crueldade. Matou religiosas, mães que apenas queriam encontrar os corpos de seus filhos, roubou bebês de prisioneiras políticas e entregou a amigos do regime, e por ai vai. No campo econômico, abriu as portas do país para o neoliberalismo, com resultados desastrosos, incluindo a desindustrialização e o aumento da desigualdade. O regime terminou com a absurda Guerra das Malvinas.
E num outro 24 de março, só que em 1980, ocorreu talvez o fato mais absurdo causado pela direita latino-americana. Um atirador de elite do exército de El Salvador, treinado pelos EUA, assassinou o arcebispo da capital, Dom Oscar Romero, enquanto rezava uma missa. Romero havia sido Prêmio Nobel da Paz no ano anterior, por pregar a luta não violenta.
Talvez você não conheça essa história, tão absurda. Não se culpe por isso. A direita prefere falar o tempo todo sobre a ditadura cubana, mas detesta lembrar dessas coisas. Querem reescrever a história, fazendo com que todos acreditem que ditadura é coisa de socialismo, enquanto a direita sempre foi a guardiã da liberdade universal.
Então vamos lembrar uma coisa. Direita democrática é uma invenção muito recente na América Latina. Tão recente que ainda é integrada por pessoas que participaram de ditaduras não muito antigas. Normalmente são pessoas que apoiaram esses regimes e hoje posam de paladinos da liberdade (os Democratas no Brasil, por exemplo). Antes disso, não havia espaço para discordância. O sangue de Dom Oscar é a prova de que a direita do continente nunca aceitou quem discordasse dela, fosse quem fosse. Não havia limites para a violência que caía sobre as vozes dissonantes.
Que a direita tente reescrever a história eu entendo. É parte do jogo. Cabe a nós bancarmos os chatos que não se esquecem e sempre lembram o que essa gente fez até pouquíssimo tempo atrás.

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