quarta-feira, 28 de agosto de 2013

A oposição que eu queria


Queria muito que houvesse uma oposição decente ao governo que está aí. Que ela reconhecesse tudo de bom que aconteceu sob os governos recentes que tivemos, e apontasse para um futuro em que teríamos asseguradas as conquistas dos últimos 20 anos, mostrando as limitações desses governos, e como seria possível ir mais longe.
Mas a oposição que temos não se parece vagamente com isso. Quem se diz oposição à esquerda não tem nenhum projeto para o país, e são incapazes de dizer exatamente como fariam melhor do que quem está aí. Criticam o governo, e não poucas vezes com razão. Mas o que pretendem fazer caso cheguem ao poder? Ou antes: como pretendem chegar lá? Ou a idéia é passar o resto da vida lançando candidatura para "marcar posição"?
Sim, pois do jeito que está até parece que eles não sabem que discurso que só sabe dizer o que está ruim e, quando perguntado sobre os seus projetos, repete coisas genéricas como "igualdade" ou "socialismo", é coisa inconsequente de estudantes de 20 anos. Isso nunca será plataforma política para ninguém. Ou ao menos de ninguém que sonhe em chegar ao poder e governar um país. Em suma: estão condenados a fazer um discurso radical que vai fazer barulho nas redes sociais sem nenhuma penetração eleitoral.
A oposição de direita tinha muitos caminhos a seguir. Poderiam dizer que as bases da politica social do governo petista foram estabelecidas nos anos FHC. Poderiam dizer isso e explicar como fariam melhor que o governo atual, caso estivessem no poder. Poderiam dizer: "as bases das melhorias foram lançadas por nós, e garantiremos tudo o que foi conquistado, mas faremos melhor desta e daquela maneira". Seria um discurso muito respeitável, e viável eleitoralmente.
Mas por serem imbecis, não fazem nada disso. Só sabem inventar subterfúgios para mostrar o tamanho do ódio que sentem por verem os pobres brasileiros terem coisas que nunca tiveram. Só sabem ser contra o bolsa familia, o mais médicos e outros programas que incluíram na sociedade pessoas que jamais tiveram qualquer assistência do Estado.
Poderiam estar no debate político. Mas preferiram ser odiados por todos os que querem mudar o Brasil. Poderiam ter proposto algo. Mas preferiram ser derrotados em todas as eleições com os votos de quem viu sua vida ser mudada pelas políticas do governo.
Fiquem por aí chorando e lendo a Veja. Estamos mudando nosso país.Não tanto quanto queríamos e gostaríamos. Sabemos que esse governo não é o dos nossos sonhos. Mas convenhamos: com essa oposição que está aí. até que estamos bem. Fizemos o que podíamos.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Mais médicos


Não dá pra entender racionalmente que alguém seja contra o programa Mais Médicos. Claro que é plenamente aceitável discutir aspectos tanto do projeto como de sua implementação. Mas a má vontade que tanta gente tem demostrado, incluindo em certos casos tons nitidamente preconceituosos, é algo que chama a atenção. Por que se aborrecer com o fato de que médicos estrangeiros se destinem a postos que nenhum médico brasileiro quis ocupar? Como um programa que traz médicos para cuidar de pessoas que não tem médico nenhum pode ser visto de forma negativa? Pelo que vejo, há três conjuntos de motivos, que podem aparecer juntos ou separados.
O primeiro, muito comum nas manifestações de médicos, é o corporativismo.Os profissionais da área sabem (ou ao menos intuem) que o programa pode interferir em suas carreiras. Afinal, a falta de médicos os beneficia tremendamente. Podem ocupar diversos empregos públicos, não trabalhar de verdade em nenhum, ganhando fortunas e sendo visto como semideuses (atenção, não estou generalizando: estou dizendo que é uma possibilidade, e todos sabemos que há gente que vive assim mesmo). Ou alguém acha que esses lugares que receberão os médicos continuarão tentando laçar desesperadamente profissionais por altos salários e dando graças a deus se eles aparecerem para trabalhar uma vez por semana?
O segundo é um inacreditável resquício da guerra fria, que faz com que Cuba seja vista no Brasil de forma absolutamente irracional. O programa trará médicos de vários países, ainda que a maioria de fato seja cubana. Médicos cubanos trabalham em vários países em diversos tipos de programa, como Portugal, por exemplo. Mas não adianta: os caras veem algum tipo de associação entre um governo petista e o regime cubano e já pensam em socialismo, Che Guevara, revolução, etc. Diga-se, a esquerda embarca no mesmo tipo de irracionalidade, perdoando qualquer arbitrariedade do regime cubano em nome dos ideais políticos. Não dá pra entender em 2013 esse climão guerra fria torne uma ilha pequena, pobre e irrelevante em termos mundiais, alvo de tantas paixões.
A última, e talvez a mais triste de todas, é o elitismo indisfarçável de muitos desses argumentos. É óbvio que está sobrando gente achando que é um desperdício gastar tanto dinheiro com gente pobre. Como se, por terem sido abandonados por séculos pelo Estado, essa gente não precisasse de mais nada. Tipo "já estão acostumados com isso mesmo...". Sem falar na nossa inacreditável tendência a achar que médicos são superiores aos pobres mortais, tão patente nessa coisa de eu, doutor em história, ter obrigação de chamar um cara que só tem graduação de "doutor" para que ele fale comigo. Junte-se isso ao elitismo citado e chegamos à conclusão que ser médico é coisa para poucos, não é pra qualquer um. Não querem médico com "cara de empregada doméstica", como disse a jornalista da foto. Quem é negro e/ou pobre tem de ser empregada doméstica, motorista, etc. Médico, advogado, jornalista, tem de ser branquinho com cara de ator da Globo.
Agora, vejam que interessante: nenhum desses argumentos tem qualquer preocupação com a saúde das pessoas carentes e abandonadas que passarão a ser atendidas regularmente por um médico pela primeira vez na vida. Na verdade isso é o que menos surpreende. Não fosse a existência de tantos que pensam essas coisas, não haveria tanta gente desassistida em pleno 2013. Eles não toleram que pobre tenha direito. Tem medo de que se fortaleçam a ponto de competir em igualdade com eles. Infelizmente é assim. Mas a gente continua tentando mudar um pouco o cenário.

domingo, 25 de agosto de 2013

Corrupção


O que começou como uma justíssima indignação contra uma série de problemas que afetam claramente nossas vidas terminou de forma muito estranha. O resultado dos protestos que tivemos em meados do ano foi a criação de um imaginário difuso que define a corrupção como o maior problema que o Brasil enfrenta.
Se indignar com a corrupção não é e nunca vai ser um problema. Cada centavo que escorre pelos ralos da roubalheira é parte da explicação para os problemas que temos. Discordar disso é brigar com os fatos. Corrupção sempre é ruim, e sempre deve ser combatida. Mas o que me aborrece não é isso. Meu aborrecimento tem outros motivos.
O primeiro: ser contra a corrupção não é, nunca foi e nunca será uma plataforma política. Para governar, é necessário ter políticas econômicas, sociais e culturais, bem como uma concepção de como se fazer política. Ser contra a corrupção não contribui minimamente para nada disso. Ser contra a corrupção é uma agenda negativa. Diz o que voce NÃO quer. Mas não diz nada sobre como você gostaria que o mundo fosse. Não dá para governar assim.
Outro problema é que esse ponto de vista faz com que governos passem a ser avaliados apenas baseado em um unico critério. O que não apenas leva a generalizações a partir de um aspecto específico, e por sinal, é super dificil de mensurar (como saber quanto de corrupção houve em um governo?), mas também faz com que ignoremos coisas muito importantes. Os governos Itamar-FHC acabaram com a inflação. Mas vamos achar que eles foram uma porcaria por conta da corrupção. Os governos Lula-Dilma tiveram avanços impressionantes na questão social. Mas o que importa é apenas a corrupção que aconteceu nesse intervalo de tempo. O Brasil melhorou muito nesses 20 anos, mas a gente acha isso irrelevante, já que esses governos tiveram episódios claros de corrupção.
Um problema adicional, e talvez o mais importante de todos, é que essa visão de mundo pode levar a um verdadeiro desastre. Normalmente o ódio à corrupção leva à constatação de que todo politico é ladrão. E a história nos ensina, da forma mais clara e cristalina possível, que normalmente isso leva à esperança de um outsider, não identificado à politica tradicional, que dê um jeito nisso tudo. Vejamos os exemplos recentes desse tipo de pensamento.
1960. Jânio se elegeu prometendo varrer a corrupção. Era de um partido pequeno, não queria se identificar com os politicos, que lhe pareciam viciados. Sem apoios e alianças, não conseguiu governar, renunciou e jogou o Brasil numa crise que culminou na ditadura.
1964. O golpe não foi especificamente voltado ao combate contra a corrupção, mas teve imenso apoio exatamente pela ideia de "acabar com essa baderna que os políticos criaram". O resultado foram 20 anos de ditadura, que terminaram com um país falido, dívida externa gigante e inflação em alta (nem vamos falar das violações aos direitos humanos, típica de qualquer ditadura).
1989. Cansado de corrupção, o Brasil elegeu como presidente um jovem, filiado a um partido pequeno. Esperando que ele desse um basta à "roubalheira". Estavam tão fixados na coisa da corrupção, tão maravilhados com a juventude e energia daquele que prometia ser um super-homem, que nem notaram que a seu lado, no palanque, estavam todos os que tinham colocado o Brasil naquela situação. Escolheram ignorar que elegiam um político criado pela ditadura, filho legítimo da oligarquia nordestina, esperando por algo diferente de tudo o que havia acontecido antes. Por um único motivo: a fama, cuidadosamente construída nos anos anteriores, de "caçador de marajás".
A triste constatação é: o Brasil está prontinho para repetir esses episódios. Politicas econômicas, sociais, culturais, nada disso importa. O que tanta gente quer é um super homem que apareça do nada dizendo que vai colocar um fim à roubalheira. Pode ter se criado nos partidos que estão aí. Pode ser apoiado pelos de sempre. Não importa. Basta se apresentar como "novidade", dizer que é portador de um "jeito novo de fazer política" e garantir que vai acabar com a corrupção. Se puder ter um verniz progressista então, perfeito.
O Brasil está pronto para um candidato que não tenha opinião sobre nada, não diga nada sobre nada, apenas se apresente como novo, mesmo que ninguém sabe o que ele pensa. Somos um bando de moralistas de direita querendo que alguém nos salve dessa bandalheira.
Marina Silva, o Brasil é seu. Tome posse logo.