domingo, 4 de dezembro de 2011

Sócrates Brasileiro


Nasci em 1972, mas minhas lembranças do mundo começam basicamente em 1979. É curioso, antes desse ano praticamente só tenho lembranças vaguíssimas, mas a partir dali lembro de tudo. Tome-se como exemplo o futebol: não lembro de nada do brasileirão de 1978, e me recordo de tudo do campeonato de 1979. E isso vale para a seleção: não tenho qualquer memória do mundial da Argentina, mas me lembro de cada detalhe da Copa América de 1979. E foi ali que me apaixonei pela seleção brasileira.
Naquela época o torneio não tinha sede fixa. Brasil, Argentina e Bolívia estavam numa chave de jogos todos contra todos ida e volta, em que o melhor se classificava para as semifinais. Os bolivianos começaram vencendo os dois gigantes na altitude de La Paz (aliás, boa lembrança para uns malas que dizem que "antigamente não tinha esse negócio de altitude"). Assim, o encontro entre brasileiros e argentinos no Monumental de Nuñez valia a sobrevivência no torneio. Aos 7 anos sucumbi ao sono e não vi o jogo contra a Bolívia. Então meu primeiro jogo da seleção foi aquele.
Aos 7 anos eu entendi perfeitamente como aquele jogo já era um clássico. Como sempre o jogo foi disputado, e terminou 2 a 2. Sócrates marcou os dois gols do Brasil, Leão falhou nos dois gols da Argentina. Naquele dia nasceu meu vínculo com a seleção brasileira. E graças principalmente ao Magrão, esse vínculo começou com muito orgulho.



Ao longo dos três anos seguintes vi Telê Santana montar a maior seleção de futebol que eu vi na minha vida. E quando finalmente chegou minha primeira copa do mundo eu mal me aguentava para ver aquele timaço atropelar todo mundo. E no dia 14 de junho de 1982, morrendo de ansiedade, sentei para ver a estréia da seleção, contra a URSS.
E deu TUDO errado. Valdir Peres engoliu um franco, os soviéticos saíram na frente logo de cara. o Brasil atacava, atacava, mas mal levava perigo. A defesa soviética era ótima, se retrancava, o goleirão pegava tudo. E os caras ainda contra-atacavam, e se não fosse o juiz amigo, teríamos levado outro gol, de pênalti.
Eu me desesperava, achava que íamos perder, que a vida era uma droga. Nos meus 10 anos não conseguia pensar em nada pior do que aquilo. Não havia explicação para tamanha desgraça. Até que a uns 15 minutos do fim ele, Sócrates, acertou uma cacetada do meio da rua e empatou. Foi um dos momentos mais alegres da minha vida. E só de ouvir a fenomenal narração do Luciano do Valle para os dois gols da vitória brasileira volto a ser o garoto de 10 anos que não conseguia conceber a idéia de que pudesse haver na vida algo mais importante do que a seleção brasileira em uma copa do mundo.




Quatro anos depois a seleção voltava ao mundial, a última chance daquela geração de ouro, a última grande geração do nosso futebol. Na nossa cabeça, era questão de vida ou morte aquele título. E a estréia foi tão ou mais tensa que a outra. A Espanha era um time excelente, cheio de bons jogadores, e (convenhamos) o Brasil não era mais o mesmo. Zico, lesionado, entrava na reta final dos jogos. Cerezo, Leandro e Éder não estavam lá, outros não eram mais os mesmos. O jogo era ótimo, lá e cá, o apito amigo ajudou de novo (Michel marcou um gol não assinalado pelo juiz), e a tensão era total.
Até que finalmente o Brasil conseguiu fazer o gol, que seria o da vitória. De novo ele, Sócrates.




Três das mais maravilhosas alegrias que o futebol me deu vieram através de Sócrates. Um super craque, daqueles que deixam lembranças eternas. A morte dele hoje me deixou numa tristeza imensa. Deu uma saudade incrível de um tempo que não vai voltar, um tempo em que a Globo não precisava forjar uma ligação artificial do torcedor com a seleção, pois nós éramos mesmo apaixonados por ela. Afinal, era de fato uma geração de craques, de um tipo que voce amava dentro e fora do campo. Sócrates era um baita símbolo de um tempo maravilhoso do nosso futebol.

2 comentários:

  1. Lindo texto Tiago, lirico... Você é um romantico quando o assunto é futebol!!!

    #LindoIsso

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  2. hahahaha... concordo co a Pandora! Parabéns pelo texto!

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