domingo, 20 de novembro de 2011

O Meu Marxismo


Alguns amigos que compartilham minha posição política esquerdista por vezes entram aqui no blog e se decepcionam. Acham que eu deveria botar pra quebrar nos tucanos e petistas e defender o socialismo. Mas essa não é nem será a postura deste blog por dois motivos.
O primeiro é que detesto blogs partidários. Eles até poderiam desempenhar uma função interessante, mas na prática a maioria nada mais é do que repetição ao infinito de textos que poderiam todos se chamar "somos perfeitos e todos os outros partidos são lixo". Tô fora. Além do mais já tem blog demais assim. O 171 é de análise.
Por outro lado, não vejo incoerencia entre meu marxismo e essa postura. Quem leu Marx sabe que ele era bem diferente desse "inimigo número 1 da burguesia" que muita gente pinta (exatamente por não tê-lo lido). Como muito bem mostrou Marshall Berman, o velho mestra via com imensa admiração as espetaculares realizações da burguesia. Lhe soava inacreditável como o capitalismo havia conseguido transformar o mundo tão rápido e tão profundamente. Além disso, Marx citava com muito respeito pensadores essenciais do capitalismo, como Adam Smith e David Ricardo.
A questão é que ele achava que essa revolução não terminaria por ali. Para Marx, a burguesia havia criado um mundo absolutamente revolucionário, em que "tudo o que é sólido desmancha no ar", e no fim das contas essa revolução permanente destruiria a ela própria. Era necessário, para ele, resolver problemas como a propriedade privada dos meios de produção, algo que era impossível dentro do capitalismo. Os pensadores liberais, muitos dos quais competentes, não percebiam isso porque estavam do lado vencedor, o que os fazia superestimar as maravilhas do capitalismo. Aqueles que viviam o lado derrotado deveriam perceber mais claramente que jamais conseguiriam viver bem naquele sistema, e trabalhar para derrubá-lo.
O grande erro que a esquerda cometeu, a meu ver, foi investir muito pouco em tentar reavaliar isso tudo. Marx morreu em 1883. O que ele chamava de "capitalismo" é muitíssimo diferente do que vivemos hoje. A idéia geral segue muito forte, mas há milhões de coisas que não fecham mais. O operário deixou de ser alguém que morre aos 30 anos e o pulmão cheio de fuligem, por exemplo. A velha estratégia não pode funcionar.
Mas voltando ao início, não acho que o fato de eu ver coisas positivas nos últimos dois governos me afaste do marxismo. Dizer, como um importantíssimo intelectual brasileiro fez, que FHC não teve nada a ver com o fim da inflação, e que ela terminou sozinha (?!) ou que o aumento na renda da população em geral do governo Lula "não quer dizer nada", isso tudo não é marxismo, é vontade de dar cabeçada na parede.
Me sinto perfeitamente confortável na minha posição marxista ao dizer o seguinte. FHC e os tucanos foram brilhantes ao terminar com a inflação, mas eles ficam muitíssimo satisfeitos com a desigualdade e exploração que temos hoje. Lula e o PT permitiram que muita gente entrasse no consumo, mas evidentemente isso é pouco. Um povo melhor alimentado e com melhor poder de compra não é um povo livre da exploração.
Os dois lados entregaram um país melhor do que receberam. Mas como estão do lado vencedor não percebem (ou não querem perceber; Marx mostrou que as duas coisas convivem muito bem) que ainda é pouco. Nos oito anos tucanos e nos oito anos petistas, o Brasil melhorou, mas nesse ritmo, ainda será o mesmo país em 100 anos. Melhor, mas com as mesmas características. Não pode. Tem de enfiar o pé no acelerador. Quem não mexe na exploração, na desigualdade, na porcaria de educação que temos, não vai mudar o país. E essa turma que está aí não tem a menor intenção de fazer nada disso.

5 comentários:

  1. Então o "171 é de análise"! Desconfiei desde o principio! Enfim, eu estudo história a apenas 5 anos, não da pra opinar sobre os caminhos do Brasil, Marxismo e derivativos ainda...

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  2. Tupi or not Tupi, that is the question...

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  3. Muito bom o texto! Concordo plenamente com a sua análise sobre "o mestre", um de seus "discípulos" mais famosos, Vladimir I. Lenin, dizia que nenhum marxista conseguiu entender Marx, isso em 1913.

    Estamos em 2011, e pelo que vejo, Ulyanov continua tendo uma certa razão, pois a maioria dos Marxistas ainda não compreenderam plenamente o velho barbudo.

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  4. um discurso muito forte de uma corrente historiográfica atual (não sei porque, nem quais são seus objetivos) critica o marxismo por ele servir aos poderosos que tem fome de poder. esse texto, no entanto, veio mostrar que o contrário dessa idéia é bastante plausível também. excelente texto tiago. parabéns!

    Ass.: Thiagão.

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