Conversava hoje com uma pessoa da aeronáutica, e confesso que fiquei meio assustado com o que ouvi. Segundo meu interlocutor, eles estão completamente sucateados, adquirindo equipamentos (incluindo aviões) usados, com até meio século (!) de uso. Me disse ainda que acha improvável que exército e marinha estejam melhores.
Nossa sociedade claramente tem medo de suas próprias forças armadas. E tem bons motivos para isso. Não satisfeitos em terem destruído o Brasil, eles cultivam com muito cuidado a versão de que a ditadura militar que tivemos foi um ato patriótico que salvou o país do comunismo. Isso é ensinado repetidamente nos colégios militares, o que indica que nos quartéis é a versão dominante ainda hoje, incluindo para pessoas que nasceram já sob a democracia. Ou seja, se é esmagadora entre os militares, a idéia de que a ditadura foi uma coisa maravilhosa, o que os impede de num outro momento acharem que devem fazer isso de novo? nada, né?
Há mais: a guerra fria nos tornou completamente desconfiados de investimentos em armamentos, que passaram a ser associados a imperialismo, e coisas do gênero. Some-se a isso o fato de nosso país não ser protagonista de uma guerra há 140 anos e não ter qualquer perspectiva de o ser novamente e pronto: ninguém liga para nossas forças armadas.
Eu acho isso um baita erro. Para começar, um erro de lógica: mesmo a mais fuleira das forças armadas consegue subjugar a população civil e desarmada de seu país, se assim desejar. Ter exército mal equipado não ajudará em nada a impedir a repetição dos tristes episódios que vivemos há algumas décadas.
Por outro lado, o Brasil é um país gigantesco, e tem enormes fronteiras desabitadas com países que, em alguns casos, tem problemas evidentes com guerrilhas e narcotráfico, e uma Amazônia com áreas enormes com pouca ou nenhuma presença do Estado. É indiscutível que há sentido para a existência do exército.
Mais que isso: um país indefeso é um país que sempre está a mercê dos outros. Eu sei, não há qualquer vaga perspectiva de risco concreto. Mas uma coisa que aprendi como historiador é que esse é o tipo de coisa que pode mudar em relativamente pouco tempo. Quer um exemplo?
No dia 11 de setembro de 1973 um golpe militar derrubou o presidente chileno Salvador Allende. Você certamente sabe disso. O que provavelmente você não sabe, é que os norte-americanos enviaram representantes de sua marinha para os limites das águas territoriais chilenas, caso fosse necessário intervir. Traduzindo: se as forças leais a Allende estivessem levando a melhor, o país seria invadido por unidades da marinha dos EUA. Que tal?
Outro exemplo: no final de 1978 os lunáticos da ditadura argentina quase empurraram o país para uma guerra absurda e sem sentido contra o Chile por conta de um pedaço da Terra do Fogo. A guerra foi abortada no último minuto graças à intervenção do Vaticano. Mas provavelmente pesou o fato de o exército chileno ser melhor equipado que o argentino, tornando a vitória muito difícil para a turminha de Videla.
Pode parecer algo quase impossível, mas não é. Neste século tivemos dois golpes militares (Venezuela e Honduras) no velho estilo, com apoio-norte-americano, da Igreja e dos empresários contra presidentes populares. O que mostra que os riscos de sempre não desapareceram, a despeito do triunfalismo de muitos que consideram esse tipo de coisa uma página virada.
Por outro lado, veja o Irã. O país é abominado pelo ocidente, deve ser o mais odiado pelos EUA atualmente. Agora me diga: os norte-americanos mexem com eles? Não, pois se acredita que eles tenham a bomba atômica ou estejam perto de tê-la. Por outro lado, se metem á vontade com países sem poder de fogo, tais como Líbia e Venezuela.
A grande verdade é: ninguém se mete com países que tenham forças armadas dignas do nome. Nenhum país jamais se protegeu graças à habilidade diplomática ou por ser modelo de democracia ou crescimento. Em política internacional, as armas são essenciais. Não é o mundo que eu gostaria de viver, mas é o mundo em que vivo. E o Brasil tem de acordar para isso.
O Brasil tem que acordar para tanta coisa Tiago, que as vezes eu penso que não poderia haver tantas! E eu concordo com você em muitos aspectos!
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