quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Cuba: a ilha da fantasia



A visita de Dilma a Cuba faz com que, desgraçadamente, o país vire tema central da nossa pauta política. E digo "desgraçadamente" por um motivo. A Cuba discutida não existe. É uma coisa irreal, mera projeção das fantasias de cada um. Porque entender o país de fato, ninguém quer.
Para a direita, Cuba é uma monstruosidade, um lugar onde cidadãos são aterrorizados por um regime assassino. E ainda por cima não conseguiu tirar o país da pobreza (ao contrário de vizinhos de perfil semelhante, como Haiti e Jamaica, que se mantiveram no capitalismo e são potências econômicas).
Para a esquerda, Cuba é uma autêntica democracia. Nesse argumento, muito mais importante do que votar em eleições com resultados pré-definidos pelo "sistema" é a população saber ler, escrever e ter acesso a um bom sistema de saúde pública (como se "democracia" e "bem estar" fossem termos excludentes). O corolário é: não existe ditadura, apenas terroristas financiados pelos EUA que tentam derrubar o regime contra a vontade popular.
E há um terceiro grupo, a meu ver o mais deprimente. É o pessoal do PT "roots", que defende aquele argumento "não tem importância fazermos tantas concessões à direita, o que importa é que estamos revolucionando o país". Para eles, uma visita como essa é uma festa. Afinal os amigos direitistas do governo estão preocupados demais em saquear os cofres públicos e agradar o eleitorado reacionário para se preocupar com política externa. Dilma pode elogiar Cuba, falar qualquer fanfarronada, e essa galera "esquerdista" fica feliz. Vêem nisso uma prova de que há imensas afinidades entre o lulo-petismo e o regime cubano. Para esse pessoal, geralmente profissionais muito bem pagos da classe média, o PT está acabando com a burguesia brasileira, assim como Fidel fez em Cuba.
O triste é que o Brasil teria muito a aprender com a experiência cubana, Tanto em termos do que se deve fazer quanto em termos do que não se deve fazer. Os indicadores sociais daquele país pobre são excepcionais em termos de América Latina, e só um imbecil pode argumentar a sério que não temos nada a aprender com eles em termos de políticas sociais de massa. Ainda mais um país tão desigual como o nosso. Não podermos nos dar ao luxo de nem tentar aprender com os cubanos.
Por outro lado, Cuba tem um mesmo governo há mais de 50 anos. Houve apenas uma mudança, entre irmãos e motivada por incapacidade física. Por mais que haja mesmo gente financiada de fora tentando destruir o regime (o que, sob qualquer ponto de vista, é uma traição nacional que nenhum governo toleraria), negar que a liberdade por lá é extremamente limitada seria outra tolice. Pensar em que medida um Estado tão grande pode criar condições para uma ditadura incontestável também seria importante. Algo em que os socialistas deveriam estar pensando sem parar há uns 20 anos pelo menos.
Em suma, seria fantástico se refletíssemos a sério sobre a experiência cubana, tentando aprender com seus acertos e erros. Mas pelo jeito vamos seguir nessa briga idiota que não interessa a ninguém. Ao menos ninguém que queira ser sério.

2 comentários:

  1. E eu senti falta de sua língua afiada para comentar essas coisas!!! Depois do saudosismo seja bem vindo de volta Tiago!!!

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  2. Voltou bem, das merecidas férias. Qual a sua opinião sobre a Yoani Sánchez, Tiago?

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