No caso o que mais me chamou a atenção foi a degradação total da vida nas nossas cidades. Montevidéu é a capital de um país, tem a população equivalente à de Porto Alegre ou Recife. Mas a violência é muito pequena, quase não há problemas de trânsito (na hora do rush, com mais carros na rua, o trânsito pode ficar um pouquinho mais lento, apenas isso), os jovens se sentam em praças noite adentro tomando vinho ou mate sem medo de serem incomodados. Nos fins de semana pode-se pegar ônibus novos e confortáveis ao preço de 1,75 real e viajar sem se sentir numa lata de sardinha ou ouvir música alta. Você pode ir a um dos vários parques públicos arborizados e fazer um programa familiar sem gastar quase nada. Nesses parques há programa para crianças, feiras de artesanato, enormes áreas onde se pode sentar e ver o tempo passar.
Ou seja, nada parecido com o Brasil. Em cidades médias e grandes nada disso existe. Todos vivem com pânico da violência, o trânsito é insuportável, sair à noite só em lugares cobertos e com muita segurança, fim de semana vamos voando para shoppings, nossas únicas opções de lazer, onde só podemos gastar, gastar e gastar. Transporte público nem pensar, vamos todos com nossos carros, colaborando para as cidades ficarem ainda mais intransitáveis.
Quando eu era criança essa era uma boa descrição para Rio e São Paulo, cidades com um tamanho que inviabiliza uma vida decente. Mas agora não é mais assim. Belo Horizonte, que sempre se orgulhou de ser uma metrópole com ar interiorano, já é uma cidade completamente saturada, com todos os problemas descritos acima. A deliciosa João Pessoa, que nem é tão grande, já tem um trânsito insuportável.
O que me surpreende nessa viagens para fora daqui é perceber que essas coisas todas, que para nós são absolutamente normais, na verdade são excrescências absurdas, que passamos a considerar absolutamente naturais. Veja como nos acostumamos com isso: nos últimos anos o Brasil melhorou em muitos aspectos, mas só piorou nesses. E nenhum de nós reclamou. Prova de que achamos tudo isso muito normal.
Aí eu fico preocupado. O pior não é o problema. O pior é não reconhecer o problema. Aparentemente consideramos a coisa mais normal do mundo ver as cidades como um verdadeiro inferno, no qual somos condenados a viver. Não vemos cenários alternativos. O que desobriga os gestores de pensarem em soluções para esses problemas. Afinal, se nem pensamos que poderia ser diferente, não vamos cobrar melhorias. Aí nossos políticos nem pensarão no assunto, fazendo com que tudo siga piorando. E nós aqui, felizes de sofremos barbaramente, mas dentro de um bom carro.
Fundo do poço
ResponderExcluirAfogando no fundo do posso
sem querer.
Rasos buscando bóias.
Só pra não afogar
A busca preguiçosa pelo conforto
o avanço tecnológico desesperado
a razão do carro e do rio
do trabalho e do domingo!
Quando a bóia não suportar
Afundar até a boca
Corpo e alma naturalmente reagem
E viva-revolução.
Mas filho, isso é a tragédia brasileira em seu sentido profundo,
ResponderExcluirvelha filosofia, "farinha pouca meu pirão primeiro", quem não tem carro,nem dinheiro para lazer, não tem voz nem consciência, então lá vamos nós. Quem tem poder está muito ocupado com outras prioridades como construir novos viadutos e hidrelétricas para atender a quem tem voz carros e lazer trancado, mas lazer. Sua mãe, anônima.