domingo, 15 de janeiro de 2012

A luta contra as drogas e a nova indústria da seca



O tema do combate às drogas voltou à pauta com a desastrada ação na cracolandia paulista. A polarização é a de sempre. Gente, como eu, que acha que esse tipo de ação é desumana e ineficaz e gente que acha que "tem pena deles? leva pra sua casa!", são os clássicos que acham que viciados são vagabundos e merecem porrada mesmo.
Acho a discussão ótima. Mas acho que falta um dado. Li alguns colegas, com os quais normalmente concordo, dizendo que a ação de Alckmin/Kassab reflete um país que ainda não se livrou de fato da visão de mundo ditatorial. Aí eu não concordo. O ponto de vista que alimenta esse tipo de ação é comuníssimo em países que nunca conheceram ditaduras, como os EUA. Não acho que seja por aí.
Vamos tentar por outro lado: a eficácia do método. Uma pessoa tem de ser excepcionalmente estúpida para achar que essa ação vai resolver algo. Ou alguém acha que expulsando os viciados dali eles irão para casa, tomarão um banho, vão procurar emprego e resolverão sua vida? Óbvio que eles irão para outro lugar. O pesadelo apenas se desloca geograficamente.
O mesmo vale para o combate ao tráfico. A discussão normalmente opõe gente que teve orgasmos assistindo o Bope torturando traficantes em Tropa de Elite e acha que "tem de sentar porrada nesses marginais" aos que encaram as drogas como um problema social. Só que a questão também tem de ser encarada sob a ótica da eficácia. Esse modelo de criminalização e combate ao tráfico resolveu algo?
Não sou nenhum especialista. Mas desde que me conheço por gente vejo a mesma história: políticos se elegem com a bandeira do combate ao tráfico, morros são ocupados, drogas são apreendidas, traficantes são presos ou assassinados, e o tanto o tráfico quanto o consumo não param de crescer. Mesmo quem acha que traficantes e usuários nada mais merecem além da morte não há de estar feliz com esse modelo pelo simples fato de que não está funcionando. Ações desse tipo são repetidas incessantemente sem que qualquer resultado tangível seja alcançado.
Tampouco defendo o "liberou geral" sob o ingênuo argumento de que se as drogas forem liberadas os traficantes virarão motoristas de ônibus ou varredores de rua por falta do que vender (claro que nesse caso o esquema do tráfico se voltará para outros ofícios, como tráfico de armas e coisas do gênero, e a violência seguirá vivíssima). Só acho que temos de discutir com seriedade o que fazer. O modelo atual fracassou completamente. Ou melhor, não exatamente.
O modelo atual funciona muito bem para certos tipos de pessoas. Para o político demagogo que vive dos votos dos ingênuos que acham que umas porradinhas em traficantes resolvem os problemas ele funciona perfeitamente. O mesmo vale para os Datenas da vida ou os policiais e militares alçados ao posto de heróis do dia por ações sem nenhuma relevância, como matar um traficante que será substituído por outro 5 minutos depois.
Ou seja, o combate ao tráfico se transformou em algo muito parecido com o que era a velha indústria da seca. Faz a vida de pilantras e demagogos, que se transformam em heróis e drenam preciosos recursos públicos para ações que muito evidentemente não resolverão nada. A grande diferença é que desta vez o público-alvo da enganação vive em cidades, tem acesso à informação, tem todos os elementos para perceber claramente que esse tipo de ação não resolve nada. E segue cultivando o auto-engano.

Um comentário:

  1. Será que o povo continua se auto-enganando, porque as "informações" que recebem são do interesse dos donos do poder? Tenho certeza que sim.

    ResponderExcluir