domingo, 23 de outubro de 2011

Mimimi direitista


Ao contrário do que dizem os blogueiros progressistas, o Brasil não fez nenhuma revolução no governo Lula. Mas não dá pra discutir que vivemos o melhor momento econômico em muitos anos. O que faz com que as tensões sociais estejam absolutamente controladas. Politicamente vivemos a democracia talvez mais sólida que já tivemos. Está muitíssimo longe de ser o país que queremos, mas indubitavelmente é o melhor momento em muitos anos.
Mas como você sabe, quem lê jornais e revistas e vê TV não sabe de nada disso. Nesses espaços temos um governo maluco, que adota políticas "heterodoxas" (leia-se não-liberais), inventou a corrupção e, o mais genial de tudo, impede as críticas a ele (embora esses veículos critiquem o governo o todo santo dia), ameaçando a democracia e a liberdade de imprensa. Tudo isso, claro, dito por órgãos que apoiaram entusiasticamente a ditadura militar.
Pois é, essa história se repete por todo nosso pobre continente. Basta acompanhar o noticiário sobre as eleições argentinas. É exatamente igual. Reclamam que não há liberdade, ainda que todos os principais veículos desçam o pau no governo diariamente, reclama-se da desastrada condução da economia, ainda que o país viva seu melhor momento no século, e as "análises" concluem que Cristina teve essa votação avassaladora porque enganou o povo com mentiras e a oposição é estúpida.
Por exemplo: logo após o fim da votação, Elisa Carrió reconheceu a derrota, comparou Cristina Kirchner a Gaddafi e disse que ela, Carrió, vai liderar a resistência à ditadura kirchnerista. Veja bem: ela disse isso ao fim de eleições livres e gerais, nas quais Cristina foi reeleita com votação consagradora! Eu sei, Lilita é um tipo deplorável que estava tentando desviar a atenção para o fato de não ter chegado aos 2% dos votos, atrás do trotskista Altamira. Mas ainda assim: o fato de ter escolhido esse argumento em particular já diz muito.
Veja: desde o surgimento do peronismo, foram disputadas 14 eleições presidenciais na Argentina. Das 12 que o peronismo pôde disputar, venceu 10 (perdeu apenas em 1983 e 1999), e nas duas em que não pôde concorrer apoiou o candidato vencedor. Ou seja: de 14 eleições, venceu 12. Só que nenhum desses presidentes eleitos dos anos 40 aos anos 70 pôde terminar seu mandato, sempre derrubados com o apoio desses mesmos que hoje falam que o kirchnerismo é uma ditadura.
No Brasil, ficamos de 1930 a 1989 (quase 60 anos!) numa tremenda instabilidade, com apenas 2 presidentes eleitos terminando o mandato (Dutra e JK), enquanto 4 foram derrubados/afastados (Vargas/45, Café Filho, Carlos Luz e Jango), um se suicidou e um renunciou. Essa zorra toda porque a direita (apoiada frequentemente por esses veículos de mídia que chamam Lula de ditador) achava inaceitável que o povo votasse em candidatos que ela não gostava.
Na Argentina o mesmo: ficaram de 1928 a 1989 sem UM presidente eleito livremente terminando o mandato. Tudo porque o povo era maciçamente peronista, e a direita achava isso inaceitável. Assim, de 1946 a 1983 foram 3 ditaduras, 4 presidentes derrubados, assassinatos e prisões por delito de opinião. Clarín e La Nación adorando tudo (e agora acham que o kirchnerismo é ditadura).
Agora me diga: quem é democrata e quem apóia ditadura?
Como sempre digo: a direita latino-americana tem uma anomalia. Foi acostumada a nunca perder eleições. Sempre foi preservada das derrotas, seja por seus jagunços, seja pelos militares, seja pelos norte-americanos. Viraram criancinhas mimadas que não sabem perder. Acham que democracia é quando eles ganham, e quando perdem, dizem que não deveria ter valido, que é ditadura, manipulação (leia-se: "se perdemos é porque fomos roubados"), isso quando não adotam discursos golpistas.
Uma das características essenciais do liberalismo é a crença incondicional na democracia, e essa talvez seja sua grande contribuição à humanidade. Mas aqui na América Latina isso não chegou. Nossa direita ainda não entendeu que eleição é como futebol: se ganha e se perde, e é o jogo jogado. Mas essas verdadeiras crianças mimadas realmente se acham as donas da bola. Se perdem, querem acabar com a brincadeira. Ou mudar a regra do jogo. Ou chamam alguém mais forte para resolver o problema a favor deles. Até quando?

4 comentários:

  1. O mais curioso é que o Futebol Portenho, onde tu escreves, é da Abril. Pelo visto alguém lá tem bom senso.

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  2. Sobre o texto, é como sempre digo: Se eu estou no poder, é uma democracia. Se a oposição está no poder, é uma ditadura.

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