terça-feira, 7 de agosto de 2012

Caetano 70


Caetano Veloso chega aos 70 anos como sempre foi: despertando paixões e ódios. De um lado os que o endeusam, acreditando que tudo o que compõe, canta e fala é absolutamente sublime e genial. De outro, os que não perdoam sua arrogância, verborragia e a certeza aparentemente inabalável que possui de que veio a este planeta para iluminar seus habitantes, quer queiram eles, quer não. E o fato de que se transformou em mais um jovem progressista que se converteu em um idoso reacionário também não ajuda.
Pra ser bem sincero, essas coisas não me interessam muito. Não tenho qualquer gosto em discutir quem é legal/revolucionário/chato/reacionário e quem não é. O que vejo como relevante é o seguinte: quando escuto os discos dele, ouço um artista interessante, com várias canções de alto nível, mas que está abaixo de outros de sua geração. Suas composições são boas, e algumas são ótimas, mas nunca possuíram a força e a densidade de Milton Nascimento, a poesia de Chico Buarque ou a ousadia e criatividade de Gilberto Gil.
A grande questão é que Caetano desde sempre soube se colocar no centro do palco. Começou cedo, elaborando as composições mais emblemáticas do Tropicalismo, um termo altamente problemático que foi coisificado por críticos como se fosse uma realidade palpável e indiscutível. Nos anos 80, quando sua geração inteira declinou, o Caetano polemista se sobressaiu mais do que nunca. Milton embarcava numa viagem world music, Gil se transformava num personagem folclórico e Chico fazia da timidez um marketing involuntário. Enquanto isso, Caetano estava toda semana nos cadernos culturais dos jornais com alguma tese polêmica.
Ou seja, quanto mais velho, mais polêmico Caetano ficava, algo ímpar na trajetória de um artista. Quanto mais o brilho de sua produção musical se apagava (junto com toda a sua geração), mais passava a buscar, não poucas vezes confundindo a provocação inteligente com a busca desesperada pela polêmica fácil, "chocar". A estratégia marqueteira deu certo, e ele virou figurinha fácil no debate cultural brasileiro.
Seguindo essa linha, quando finalmente sua produção musical se apagou por completo, sua estratégia infantil de "chocar" ficou mais desesperada que nunca. Tentou se travestir de historiador do pensamento brasileiro, e convenceu uns poucos idólatras de que entende alguma coisa de autores como Joaquim Nabuco e Sérgio Buarque de Holanda. E passou a mostrar tamanho desespero que seus ataques costumeiros à esquerda começaram a parecer menos e menos "bem pensantes" e mais e mais coisa de reacionário mesmo. E pior: as pessoas pararam de respondê-lo, de se importar com ele.
No fim das contas, Caetano foi engolido por uma contradição que estava presente já no início de sua carreira. Não sendo o mais brilhante de sua geração, usou seu talento para se transformar num ícone. O problema é que não dá pra passar o resto da vida escrevendo manifestos revolucionários e chocando o mundo com provocações inteligentes. E o declínio de sua produção musical o levou a uma postura mais e mais agressiva nesse sentido.
Mas que se ressalte que nada do que foi dito acima muda o fato de que ele foi um artista de muito talento. Principalmente nos anos 60/70 fez coisas muitíssimo boas. Até nos 80 ele conseguiu emplacar umas canções bem interessantes. Isso sim é o que importa.

2 comentários:

  1. Disse tudo. Gosto do Caetano, mas desta turma toda que chega aos 70 anos, existem artistas com um saldo, digamos assim, muito mais positivo. Destaco, por exemplo, Paulinho da Viola e Ney Matogrosso.

    Aliás, de toda esta turma, sem demérito a ninguém, fico com Paulinho da Viola.

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  2. Embora minha praia seja um pouco outra... Gosto mesmo de gente como Alceu Valença, Raul Seixas e Jards Macalé. Preciso de gente que "faça mal", ou que esteja no cruzamento de várias referências musicais, ou que brinque com esse limite entre passado e presente, não que fique no "choque pelo choque" como Caetano.

    Ou, ainda, coisas muito singulares. Cartola, por exemplo.

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