domingo, 29 de abril de 2012

As mil faces da xenofobia

Hoje postei no facebook algo tipo "não me venham falar desse clássico fuleiro da Ilha da Porcaria, clássico de verdade é Gre-Nal". Não apenas porque sou gremista, mas uma gozação com torcedores do Sport e do Nautico, meus rivais locais, já que aqui em Pernambuco sou Santa Cruz.
Bem, o resultado foi totalmente desagradável. Uma aluna respondeu dizendo que eu devia voltar para o Sul, para risadas e aplausos e outros alunos. Reclamei do tom xenófobo do comentário, que é muito parecido com o que os sulistas reacionários dizem para os próprios nordestinos. Ouvi de volta: "não gosta do futebol daqui? vá embora!".
Infelizmente isso está longe de ser um episódio isolado. Tive de renunciar à presidência da seção local do órgão representativo da minha classe porque meus colegas de direção disseram que não se sentiam à vontade trabalhando com alguém de fora. Uma pessoa que gosta muito de mim disse que no início resistiu à minha pessoa porque eu era de fora. Sempre que tomo chimarrão na rua escuto gente falando "para com isso, aqui é nordeste!". Aquela brincadeira que não é só brincadeira, sabe? Alguns percebem meu desconforto e falam "não, é por que aqui é quente, não deve ser bom tomar algo quente", mas claro que elas tomam café, não é mesmo?
E nem vou relatar casos de pessoas que falam na minha frente (ou até para mim) coisas tipo "o pessoal do Sul é tudo filho da puta, odeia nordestino", etc. etc. Acontece o tempo todo.
E é bom esclarecer que as pessoas em questão não são monstros reacionários. Pelo contrário, a maioria dos envolvidos nessas situações narradas são pessoas boas, esclarecidas e que em sua maioria gostam de mim. Nem passaria pela sua cabeça me ofender de propósito. E com toda a certeza jamais se imaginariam como xenófobas.
Acho que há duas coisas aí. A primeira é mais geral: pela minha experiência de eterno andarilho, aprendi que os lugares mais abertos à gente de fora são aqueles onde todo mundo é de fora. Morei numa cidadezinha de Minas sem nunca ser incomodado por ser forasteiro, já que todos ali eram forasteiros também. Porto Alegre (onde nasci) e Recife, grandes capitais brasileiras, são muito resistentes a pessoas de fora. Pra eles é novidade. Não são cidades típicas de imigrantes. Estranham até ouvir sotaques diferentes, o que dirá hábitos que lhes parecem estranhos.
Mas há uma coisa bem específica. Minha experiência também diz que há pessoas que estão tão acostumadas ao papel de vítima, que raramente se importam com os sentimentos alheios. Só sabem se ver como alvo da maldade alheia, então nem se dão conta de que elas próprias também ferem as pessoas, e com frequencia. Já sofri muito com gente assim. E o pior é que seu papel eterno de vítima as faz não ter a capacidade de reconhecer os próprios erros. Ficam ofendidas quando alguém aponta uma atitude errada. Só sabem acusar os outros.
Acho que é um bom paralelo para o que passo aqui. Nordestinos estão tão acostumados a ser ver como vítimas do preconceito alheio, que não dedicam um minuto de suas vidas a pensar se eles próprios são o exemplo de um povo não preconceituoso. Expressam sua xenofobia à vontade, sem culpa, e sem nem perceber o que estão fazendo. E se forem confrontados com isso, reagem raivosos. Afinal, só sabem se ver como vítimas.

3 comentários:

  1. Meu pai detesta quase tudo que vem do sul/sudeste acho que cresci assim educada para ter preconceito contra pessoas que vivem no lado de "baixo do mapa"...

    Mas, de muitas forma da internet me deseducou disso, pela net acabei conhecendo pessoas dos mais variados lugares do Brasil e as vezes do mundo e isso abre os horizontes. Meu primeiro amigo virtual, que me ensinou a usar os recursos do google, do e-mail, you tube e uma série de recurso da net foi/é um gaúcho, depois de conhecer ele minha frescura preconceituosa diminuiu bastante...

    Enfim, concordo com o que vc expressou nesse post!

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  2. Caramba! Esse negócio de se fazer de vítima é uma coisa que acontece demais... Nas famílias entre pais e filhos, entre irmãos, entre os que conseguiram de alguma forma se estabilizar financeiramente e os que não correram atrás disso e agora se fazem de probrezinhos... Sorte sua conseguir perceber o joguinho e ficar fora dele! Se não sabem aceitar diferenças aí, vem pra cá.... 8-)

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  3. Na minha cidade sempre houve imigração desde sua fundação, sempre pela mineração, os comerciantes gostam dizendo que a riqueza vai aumentar, os mesmos comerciantes não gostam porque após a finalização do serviço, o que vai ficar são meninas grávidas e filhos sem pai. Como os comerciantes, todos estão calados por não ter idéia e por não se acharem capazes de fazer história. As empresas estão pouco se fudendo, com razão, pois a população prefere a conforto da ignorância ao sacrifício da luta e vê o que vai dar confiando no deus cristão.

    Um pouco de noção histórica ajudaria-nos a saber o que fazer.
    Como eu sou formado em história acho que posso fazer parte disto, me indique algum livro que me auxilie a entender este movimento.
    Obrigado desde já.

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