sábado, 2 de novembro de 2013

Liberdade de 'Expreção'

Toda vez que falo/escrevo sobre temas como a ley de medios argentina aparece gente falando em "censura" e que isso fere a "liberdade de expressão". Examinemos a questão, de um ponto de vista genérico.

Para começar, as liberdades individuais, que são o cerne do liberalismo, nem sempre coexistem em harmonia, é há a necessidade de estabelecer prioridades. O exemplo mais flagrante foi o da escravidão. Ao longo do século XIX vimos escravistas empedernidos no Brasil, no Caribe e nos EUA, dizendo que o Estado não deveria se meter em assuntos privados. O que acabou acontecendo, já que se chegou à compreensão de que as liberdades dos escravos vinham acima do direito à propriedade privada dos senhores.

Ainda nessa linha, a liberdade de expressão é um ideal, que nunca será atingido plenamente. E nem deve ser. A lei me proíbe de chegar para um desconhecido na rua e gritar "seu crioulo macaco fdp!". E está certíssima. Há limites para a liberdade de expressão, e vários deles são previstos em lei. Afinal, os próprios liberais não adoram dizer que "meu direito termina onde começa o do meu vizinho"? Pois é.

Agora a imprensa. Para começar, nunca é demais lembrar: estamos falando de empresas privadas com fins lucrativos, e não de entidades filantrópicas. Empresas assim visam uma coisa acima de todas as outras: o lucro. E não há nada errado com isso. Mas me parece óbvio que qualquer tipo de negócio deve ser regulamentado. Se assim não for, os consumidores viram reféns de serviços ruins. Basta você pensar na sua operadora de telefone celular para saber do que estou falando.

Até agora só falei obviedades. Mas veja: quem se opõe a qualquer regulamentação para as atividades de imprensa age como se não soubesse de nenhuma dessas coisas. Você acha normal que um segmento qualquer da economia seja dominado por uma dúzia de famílias, com o direito a oferecer ao consumidor o produto que quiserem sem existir nenhuma possibilidade de controle? Bem, é o que temos na imprensa brasileira. E era o que havia na Argentina.

A questão é que os barões da mídia e seus paus-mandados costumam lançar mão de uma falácia na hora de discutir o assunto. Argumentam que qualquer tipo de controle e intervenção vai contra a liberdade de expressão. Mais um passo e se critica os proponentes de algo assim como se fossem ditadores que querem impedir a "imprensa livre". É a famosa "falácia do espantalho". Se associa uma ideia ou alguém a algo indesejável, e essa ideia ou alguém passa a ser visto como tendo todos os atributos do "espantalho" a ele associado.

Por exemplo. Eu passo o dia com minha poodle no colo. A bichinha até dorme comigo. Aí algum inimigo meu diz assim: "sabe quem gostava muito de cachorro? Hitler, ele mesmo". Pronto> num instante eu deixo de ser um camarada apegado a sua cadelinha e me transformo num genocida. Baseado em que? Na falácia do espantalho.

Regulamentar as atividades de imprensa e impor controles externos de fato limitam a liberdade de expressão. Mas desde quando isso necessariamente é uma coisa é ruim? Todos nós temos nossa liberdade de expressão limitada. Por que diabos esses mega empresários têm o direito de falar sozinhos sem nenhuma forma de controle para milhões de pessoas sem sequer abrir espaço para o contraditório? Eles querem continuar tendo um direito que nós não temos. Só isso.

O que fazer para mudar a situação sem corrermos o risco de censura? Bem, uma lei de meios seria um ótimo começo. Desconcentrar a propriedade dos veículos de mídia, de forma a termos acesso a uma pluralidade de informações. Tornar esse segmento regulamentado como qualquer outro deveria ser. Simples.

Aí vem a questão do conteúdo em si. De fato é um tema delicado. Mas o assunto deve ser ao menos debatido. O que não dá é para achar que meia dúzia de empresários têm o direito de decidir o que 200 milhões de pessoas vão saber. E achar que qualquer coisa diferente disso é "ditadura".

Um comentário:

  1. - Corretíssimo! Mais que o direito de decidir por todos, controlam a informação e, com isso, o poder. Isso, sim, é ditadura.

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