Tenho sentido um impressionante clima de "fim dos anos 90" na política brasileira. Apenas com uma "pequena" diferença: PT e PSDB inverteram os papéis.
Naquele momento o PSDB havia abandonado toda a ideia original de ser um partido social-democrata. FHC havia surfado no sucesso do Plano Real, fazia um governo privatista e havia, com sua imensa habilidade política, unificado todo o campo do centro e da direita em torno de seu governo. A aliança era forte em todo o país, mas tinha como ponto forte a hegemonia total no campo da elite, entre os pobres urbanos não vinculados a sindicatos e movimentos sociais e o velho voto de cabresto nordestino.
Mas as coisas não estavam perfeitas para o governo. Havia, no fim dos 90, uma fadiga de material. Os escândalos de corrupção e sobretudo a exasperante recessão e desemprego criavam espaço para a oposição. Mas nós não sabíamos nos aproveitar disso. Ainda embasbacados com o avassalador triunfo do neoliberalismo mundo afora (muito mais que pelo fim do socialismo), não havíamos conseguido nos situar novamente.
Nos sobrava uma imensa agenda negativa. De um lado, éramos contra a corrupção, o neoliberalismo, a submissão aos EUA. Por outro, atacávamos todas as iniciativas do governo, incluindo os tímidos programas de renda mínima (que chamávamos de "esmola") e até o Toda Criança na Escola (dizíamos que o importante não era colocar as crianças na escola, mas sim dar a elas um ensino de qualidade). Dizíamos que essas iniciativas eram "eleitoreiras".
A predominância de uma agenda negativa e a adoção de bandeiras absurdamente genéricas ("ética", por exemplo) eram decorrência evidente da nossa ausência total de um projeto para o país. Sabíamos exatamente o que não queríamos, mas nem tínhamos ideia do que faríamos com o país. Entramos nas eleições de 1998 tendo como maior esperança a possibilidade de Ciro Gomes tirar votos de FHC e forçar um 2o turno FHC x Lula. Não deu. Ciro naufragou e nós tivemos os votos que sempre tínhamos, algo menos que um terço do eleitorado.
A virada só veio quatro anos depois. A fadiga de material havia aumentado muito, Serra fez uma campanha vacilante, nem governista nem oposicionaista, e Lula e Zé Dirceu tomaram a decisão que fez a diferença. Pararam de fingir que eram socialistas (algo que o PT nunca foi) e entraram de cabeça na realpolitik. Acalmaram parte dos grupos reacionários e atraíram o voto de gente que não aguentava mais viver num país sem crescimento econômico. O resto é história.
O que temos agora é bem parecido, só que com os papéis invertidos. O governo petista sente a fadiga de material, e ainda que mantenha a fidelidade incontestável de fatias do eleitorado, o espaço para uma vitória oposicionista se ampliou bastante em relação a 2010. A questão é: quem vai ocupar esse espaço?
O PSDB está exatamente como nós, da esquerda, estávamos há 15 anos. Perdido. Sequer sabe quem é. Se um partido de direita, se um arejado defensor do liberalismo, se um partido das elites. Detesta o governo petista, e tem uma gigantesca agenda negativa. Mas o que querem fazer no poder? Ninguém sabe. Nem eles. Supõe-se que diminuiriam o tamanho do Estado, mas nem isso é certo. Há dias Aécio disse que é preciso "reestatizar" a Petrobrás. Um gesto absolutamente desesperado do candidato do partido que mais fez privatizações na história do país. Espalharam privatizações em seus anos de governo, e fazem um escarcéu por uma concessão, que nem privatização é.
A incoerência do discurso aecista é tamanha que sequer precisa ser discutida em profundidade. Ela denota a total ausência de discurso e projeto que o PSDB vive hoje. Aliás, qualquer pessoa que tenha morado em Minas Gerais no período de hegemonia tucana no estado sabe: se alguém recorre a Aécio Neves, está em busca de qualquer coisa, menos de discurso e projetos. Aécio não tem nenhuma dessas coisas. Nunca teve nem terá.
Enquanto o PSDB não decidir o que quer da vida, terá dificuldades de chegar ao poder com uma agenda meramente negativa. Ser contra tudo o que o governo faz dificilmente os levará ao poder, da mesma forma que nos deixou muito longe dele em 1998. Resta a esperança em Eduardo Campos, escalado para ser para o PSDB tudo aquilo que Ciro Gomes não conseguiu ser para o PT há 15 anos. O candidato moço, bem apessoado, governador nordestino de sucesso, que emerge da aliança governista com um projeto pessoal próprio, disposto a roubar votos tradicionalmente destinados ao governo.
Na falta de um projeto, o PSDB conta com Eduardo Campos para forçar um segundo turno, exatamente como fizemos com Ciro Gomes em 1998. Naquela vez não deu certo. Em um ano saberemos se a história vai se repetir, ou se desta vez a coisa será diferente.
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