sábado, 26 de outubro de 2013

Quando os coxinhas encontram a revolução


Os protestos que surgiram no meio do ano deixaram muita gente confusa. O que é compreensível: não havia líderes, pauta definida ou qualquer projeto visível. Misturavam-se pessoas de todo o arco político, pedindo coisas diferentes e até eventualmente contraditórias. Analisar aquilo não era para qualquer um. Eu, eleitor do governo, fui em um deles, junto com um amigo, também governista. Encontrei lá todo tipo de gente. Ao menos naquele momento (estávamos no começo do processo) aquilo me parecia saudável, ainda que fosse evidente que não havia como sair nada concreto, para além de pautas pontuais.

Confusa como todos estavam, a mídia fez grandes esforços tentando explicar o que se passava. Mas na maior parte dos casos não houve uma compreensão adequada. Em geral houve uma insistência incrível em procurar líderes, organizações e projetos por trás dos protestos, algo que simplesmente não existia. Nessa busca por tentar entender pelos canais tradicionais aquilo que não tinha nada de tradicional, se chegou aos black blocs. O termo passou a ser associado a uma organização internacional, infiltrada nos protestos. O que não tem nada a ver com a realidade. Parcialmente por má fé, mas principalmente pela dificuldade de entender um fenômeno novo, os black blocs receberam um papel muito maior do que aquele que tinham de fato.

Black bloc não é uma organização. Não tem líderes ou projetos. Na verdade, teoricamente sequer tem "membros" no sentido tradicional do termo. É uma tática utilizada por um conjunto de indivíduos que podem na verdade sequer se conhecer. O grupo se junta, age e se dispersa. Tampouco tem projeto: defendem aquele anarquismo coxinha de tons fortemente moralistas que se difundiu no pós-68. No mundo de fantasia em que eles vivem, são cavaleiros lutando pela liberdade humana, querendo nos salvar dos grilhões do capitalismo. No mundo concreto, são jovens revoltados de classe média, que um dia serão direitões de 40 anos (qualquer pessoa que tem mais de 30 anos e fez curso de humanas na universidade conhece dezenas de tipos assim: "anarco-revolucionários" na juventude, reacionários na meia idade).

(Favor não confundir essa mixórdia de mauricinhos com o anarquismo, uma visão de mundo que tinha ideias e projetos, dos quais se pode gostar ou não)

Na verdade esses caras são os "revolucionários" (aham!) que a direita AMA. Vão a manifestações organizadas por outros grupos, cometem vandalismo e chamam toda a atenção para si próprios. A mídia, em especial a mais conservadora, dá enorme destaque a isso, a reivindicação real fica esquecida e seus proponentes são pintados como vândalos. Uma maravilha, não é?

O engraçado é que quando eles falam, até soam como pobres vítimas. Ninguém os entende. Quebrar carros particulares é uma forma de combater um símbolo do capitalismo. Não é vandalismo. Eles estão apoiando os movimentos sociais e fomentando a revolução que nos libertará. Não é uma maravilha?

Não, é um desastre. Eles são francamente autoritários. Eles por acaso estão preocupados se os movimentos sociais os querem lá? Nos perguntaram se gostamos daquilo? Explicam em que medida suas ações vão melhorar a vida dos mais necessitados que eles dizem querer libertar? Não. Agem assim porque acham legal e pronto. Estão se lascando para o que pensamos. Ah, e a propósito, todo mundo que não gosta deles é burro e/ou reacionário. Não há outra explicação plausível. Tente dialogar com alguém que os defende. A pessoa vai, com toda a condescendência do mundo, explicar coisas super básicas que estamos cansados de saber (afinal, só um desinformado manipulado pela mídia para não gostar deles). Quando recebem contra-argumentos, te tacham de reacionário. Bem democrático, não?

Nunca é demais lembrar: os regimes socialistas terminaram todos em ditadura por um motivo. As revoluções socialistas foram levadas à cabo por grupos que tentaram implantar o socialismo para uma população que queria reformar o capitalismo. Ou seja: tiveram de enfiar o socialismo goela abaixo de seus povos. Aí não tem jeito: terminou em ditadura. Por aí se vê o perigo desse tipo de gente.

Eles não vão implantar uma ditadura, já que não são uma organização política no sentido tradicional. Mas pensam exatamente como os revolucionários socialistas do passado: "precisamos acabar com o capitalismo, independente da vontade das pessoas. O povo só não concorda com a gente porque são mal informados. Mas nós sabemos o que é melhor para eles".

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