domingo, 22 de março de 2015

O real fardo do homem branco

Sou homem. Sou hetero. Sou branco. Sou de clásse média. Nasci em Porto Algre. Cresci no estado do Rio. Fiz meus estudos universitários em São Paulo. Em suma, estou do lado "vencedor" em muitos sentidos. Provavelmente por ter nascido e crescido em uma família maravilhosamente esquerdista, sou favorável a todas as causas subalternas. Tenho orgulho de não ser parte desse lixo egoísta que não quer pagar impostos dizendo que "vai tudo para a corrupção", quando na verdade só não querem uma distribuição de renda. Sou a favor das cotas. Apóio a causa LGBT. Amo o nordeste. Acho o feminismo uma das melhores invenções da história. Adotei uma lésbica e acho, do fundo do meu coração, que foi disparado a melhor coisa que fiz nesta vida. A coitada tem de ficar o tempo todo me expulsando porque minha vontade é ficar abraçando ela o dia inteiro, o que evidentemente a faz se sentir constrangida (com toda a razão).

E uma das coisas que mais odeio nesta vida é ver gente como eu bancando os coitados. Governo rouba nosso dinheiro ganho honestamente para sustentar nordestinos preguiçosos. Mulheres mandam no mundo, nem podemos mais dar porrada nelas. Gays dominam o mundo. Mil vezes ver filmes repletos de assassinatos do que ver pessoas do mesmo sexo se beijando em novela. Como vou explicar isso para meus filhos? Tudo é para os negros, o mundo está racista ao contrário. Essas bostas que fazem o sucesso dos Bolsonaros da vida. Um bando de gente merda que tem tudo e ainda acha pouco. Deus me mantenha longe dessa gente.

Posso imaginar vagamente o que seja estar do lado subalterno. Tudo joga contra. Certamente é uma coisa horrível. Entendo totalmente que isso faça alguém ao menor sinal de hostilidade ver um inimigo espreitando para exercer uma vez mais seu poder. Não há hipótese nesta vida de eu dizer que isso é errado. É fruto de uma dolorosa experiência de dominação baseada em motivos indefensáveis. Isso não está em discussão aqui. Meu ponto é outro.

Muitas vezes em meus 42 anos de vida fui estigmatizado como preconceituoso. Fui xingado em mesas redondas contra o racismo por ser branco. Fui taxado de homofóbico por não gostar de alguma pessoa homossexual. Me chamaram de machista e misógino dezenas de vezes. Ontem mesmo ouvi um "pessoal do sul odeia nordestino". De alguém que sabia que eu sou gaúcho, sabe perfeitamente que escolhi morar no nordeste e que amo o Recife. Durante toda a minha vida achei essas coisas tranquilas. Um preço mínimo a pagar perto do que essas pessoas passam. Mas sinceramente esse é um ponto que comecei a questionar.

Pelo seguinte: só existe um jeito do mundo melhorar, e esse é o diálogo. Caramba, se eu falei algo que não devia, me digam. Não preguem adjetivos na minha testa. Tenho a mais absoluta certeza que penso e digo coisas machistas, racistas e homofóbicas. Eu nasci e cresci num mundo assim. Na verdade nasci e cresci num mundo muito pior, em que era de boas falar "por que o mundo é redondo? pros pretos não cagarem nos cantos". Esse dia existiu, e não foi muito distante. As coisas melhoraram porque os subalternos se organizaram e gritaram. Não suportaram mais a situação. No que fizeram muitissimo bem. Hoje temos um mundo muito melhor por conta deles. Nos mostraram o quanto tudo era absurdo demais, hierarquico demais, opressivo demais. Obrigado por isso.

Mas por favor, não presumam que todo homem é deliberadamente machista. O mundo é machista. Se fazemos algo machista, conversem, nos expliquem, não fiquem pregando adjetivos na nossa testa. O mesmo para o racismo, a homofobia e todo o resto. Muita gente é insoluvelmente babaca e escrota. Simplesmente não querem sair da sua posição dominante. Em relação a esses, nada vai fazer efeito. Mas muitos de nós querem entender e melhorar. Nos ajudem. Julgar e criticar não é a melhor solução nesses casos. Dizer "cara, você está sendo machista por isso e aquilo outro" pode ser muito útil. Melhoremos juntos, por favor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário