sábado, 14 de março de 2015

Está faltando respeito

Mês passado eu estava em Portugal. Vi no face um link para uma matéria que dizia que o salário mínimo brasileiro tem atualmente o maior poder de compra em não sei quantos anos. A fonte pareceu confiável, os dados eram sólidos. Compartilhei. Uma pessoa compartilhou minha postagem dizendo "olha as mentiras que a petralhada conta" (não lembro as palavras, mas foi nesse sentido).

Caramba. A pessoa em questão não é propriamente próxima a mim, mas é amicíssima dos meus pais há décadas. Me viu nascer e crescer. Sabe quem sou eu. Precisava praticar algo tão agressivo? Tipo, eu não opinei, não disse que o governo era maravilhoso e perfeito, apenas compartilhei um link. Se o dado pode ser contestado, que se conteste. Nenhum problema. Estou cansado de saber que esses sites governistas podem perfeitamente jogar na rede algo não confiável. Adoraria aprender com uma discussão em que se contestasse um dado a favor do governo. Mas isso não foi feito. Houve apenas xingamento.

Infelizmente não se trata de um fato isolado. O fenômeno é muito comum. Em um nível que eu não vi nem no polarizadíssimo segundo turno de 1989, quando eleitores do Collor falavam "você vai votar no Lula? Quer uma família de favelados morando na sua casa?". Isso era horrível mas hoje parece um afetuoso abraço. As coisas pioraram muito. Sexta fui à manifestação da esquerda aqui no Recife e vi um minúsculo punhado de gente vermelha, com as veias do pescoço saltadas, berrando com todo o ódio do mundo "governo de merda, bando de ladrões, vocês todos estão recebendo para estar aqui, vão morar em Cuba e nos deixem em paz!".

E não é só isso. Eu, talvez ingenuamente, achei que com o fim da eleição as pessoas ficariam mais calmas. Quando terminou a apuração respirei aliviado pensando nos meus amigos que pensam totalmente diferente de mim mas que foi possível manter a amizade e o respeito. Mas não foi o que aconteceu. A coisa piorou. A derrota nas urnas deixou a maioria dessas pessoas absolutamente surtadas. Gente que eu respeito, que eu amo, que ponho a mão no fogo por elas, passou a ser capaz de me xingar. Trouxa, otário, membro de uma manada de corruptos, coisas assim. Só por minha opção política ser diferente da delas.

(Parêntesis: sou eleitor do governo, então sinto isso da parte de pessoas da oposição. Não duvido que a mesma coisa aconteça no sentido contrário. nunca vi, mas não duvido nem por um segundo que exista. Idiotice não escolhe ideologia)

Fico me perguntando como chegamos a esse ponto. Me ocorrem explicações racionais, como o açodamento diário dos grandes veículos de comunicação, que cada vez mais escolhem colunistas nessa linha para garantir mais "Likes" e "shares", que é o que mais importa hoje. Mas não pode ser só isso. Ninguém nunca me xingou por não gostar muito de batata frita, achar maminha melhor (muito melhor) que picanha, não querer ter carro, achar o Armindo Antonio Ranzolin o maior narrador de futebol de todos os tempos ou ter uma linda poodle chamada Nina. Muita gente discorda dessas escolhas. Mas nunca me xingariam por isso. Seria idiota, não é mesmo?

Mas pessoas absolutamente excelentes andam me xingando por minhas opções. Não gostam do governo, no que estão em seu completo direito, e acham que é correto invadir o meu espaço para falar grosserias, incluindo comparar pessoas que defendem a Dilma a criminosos. Não consigo encontrar explicação racional para isso. Tem muito idiota no mundo, e disso a gente sabe bem. Mas o que explica pessoas amáveis, inteligentes, delicadas, de ótimo caráter, xingarem alguém por discordarem de sua opção política? Isso eu não consigo entender.

Abaixo segue um vídeo mítico da Disney, que vi na infância repetidas vezes, mostrando um personagem tranquilo, bom caráter, virando um monstro quando sentava ao volante. Por favor, não façamos o mesmo quando falamos de política.


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