sábado, 7 de março de 2015

O mundo depois da lista

Antes de começar quero deixar uma coisa absolutamente clara. Este post é escrito analisando a situação do ponto de vista da realpolitik, que é o ponto de vista de todos os políticos de todos os tempos. Não é o meu, e provavelmente não é o seu. Mas se vamos pensar nas ações de políticos temos de tentar enxergar as coisas pelo ângulo que eles veem. Só isso.

A "lista de Janot" foi aguardada ansiosamente por todos, causando terror nos meios políticos. E quando ela chegou, ficou claro muito rapidamente quem havia sido o grande vencedor: o governo. Dilma obteve uma vitória pessoal espetacular ao não ter sido citada, como muitos esperavam. Mas não foi só isso: ao contrário de Aécio, que teve seu processo arquivado, dela sequer se encontraram indícios de envolvimento no esquema investigado. Ela saiu limpa e agora pode partir para a ofensiva.

Sim, o PT não saiu tão bem na foto. Teve vários indiciados, e um caso potencialmente explosivo, o de Cândido Vacarezza. Que se abrir a boca pode complicar muita gente do governo, ao que se supóe. Mas a situação era conhecida há tempos, e certamente já se trabalhava para que ele adote a postura de Delúbio Soares, e fique quieto. Mas de toda forma, já se esperava que esses nomes aparecessem. Ou seja, em relação às expectativas, o partido teve um desempenho não tão mau assim.

O PSDB teve uma enorme derrota, a citação de Antonio Anastasia. Cria política de Aécio, seu sucessor no governo de Minas, seu coordenador de campanha presidencial. Ou seja, ligadíssimo ao candidato derrotado à presidência, e que, graças ao sufoco que deu em Dilma, se transformou em referência nacional do partido. É absolutamente impossível argumentar que Aécio não tem nada a ver com isso ou que não sabia. Corrigindo: possível é, mas só com muita força de vontade e capacidade de estuprar a lógica.

O fato de Aécio ter tido seu processo arquivado é uma boa e má notícia para o PSDB ao mesmo tempo. É boa por evitar danos maiores, pois se Anastasia é desconhecido da maioria dos brasileiros, Aécio foi a face do PSDB nas últimas eleições. Mas o simples fato de ter sido investigado já soa como mancha. E o arquivamento desperta inevitáveis suspeitas de que a blindagem tucana tenha funcionado mais uma vez. Para piorar, há o episódio de Furnas. Aécio se enfraquece tremendamente com isso tudo, ainda que por ora tenha controlado os danos de forma eficiente.

Os grandes derrotados foram PMDB e PP. Esses dois partidos, como descrito no post anterior, não tem qualquer ideologia, sequer lançam candidato a presidencia desde o século passado e se especializaram em formar grandes bancadas no congresso para tornar impossível que qualquer um governe sem eles. Em troca de apoio parlamentar exigem ministérios, geralmente com orçamento gordo e grandes possibilidades de lambuzar-se no dinheiro público. Se me permitem um momento de opinião, e não de análise, eu acho que o Brasil será um país muito melhor no dia que não tivermos partidos assim. Pois PT e PSDB, por mais contraditórios e cheios de defeitos que sejam, tem projetos para o país. Mas carregam esses aliados corruptos, que defendem uma agenda atrasadíssima e bloqueiam um avanço mais significativo.

Esses partidos foram os dois mais citados na lista (se houve erro na conta me perdoem, sou de humanas). O PP foi o mais citado, especialmente sua bancada gaúcha, historicamente ligada aos setores ruralistas. Em seguida vem o PMDB, com destaque especial para os presidentes das duas casas legislativas, Renan Calheiros e Eduardo Cunha. Isso apenas confirma o que sabe qualquer observador racional: que são partidos que existem apenas para essa finalidade: defender interesses altamente questionáveis e mamar nas tetas do Estado. Mas há implicações políticas sérias no contexto atual.

O governo começou com Dilma de joelhos perante ruralistas e esses dois partidos. Sentia que precisaria de todo o apoio possível para a tormenta que viria. E esses grupos cobraram a conta, que veio muito alta, na forma de um ministério deprimente. Agora a coisa é outra. Com ambos os partidos repletos de envolvidos, incluindo os presidentes da câmara e do senado, são eles que precisam do governo. Não há mais espaço para a chantagem do "me dá o que eu quero ou eu fico a favor do impeachment" que vinha sendo utilizada. Dilma tem as cartas na mão para lidar com eles.

Quanto ao PSDB... FHC já sinalizou que é hora de dialogar com o governo. Leia-se, propor um "acordo de cavalheiros" em que governo e oposição concordam em seguir criticando as malfeitorias alheias em público mas não mexendo uma palha para punir os culpados. E desaparece qualquer base racional para que os eleitores de Aécio se considerem os defensores da moralidade. Ficou claríssimo que o PSDB está tão envolvido nessa história toda quanto os demais partidos. Bem, há quem siga com esse discurso, mas aí é caso para terapia.

Em suma: nada apareceu contra Dilma, a oposição se enlameou e a turma da chantagem só quer agora se salvar. PSDB e aliados duvidosos precisam do governo mais do que nunca. O impeachment foi enterrado até como possibilidade remota. Política é o espaço da curta duração, e tudo pode mudar amanhã com algum fato novo. Mas neste momento, a presidente obteve uma enorme vitória.

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