segunda-feira, 27 de abril de 2015

Por que um homossexual do sexo oposto é um "desperdício"?

Este post começou a ser pensado há anos atrás. Eu tenho uma grande amiga, de quem gosto muito, que é extremamente bonita. Loira, sorrisão cativante, corpão perfeito, linda. E lésbica. E por isso passei anos ouvindo caras se referindo a ela como um "desperdício". Não tipo "poxa, se ela fosse hetero eu apresentaria minha candidatura". Não. "Desperdício" é a palavra permanentemente usada.

Isso sempre me incomodou pra caramba. Afinal todas as pessoas do mundo podem fazer uma lista gigante de pessoas que despertam seus desejos, que nunca serão concretizados. Eu, por exemplo, trocaria tudo o que tenho por uma relação com a Alessandra Negrini. Nunca vai acontecer, paciência. Frustrações fazem parte da vida. Mas a questão é: ninguém nunca diria "nossa, que desperdício" ao ver, digamos, a Alessandra Negrini com outro cara. Mas se fosse com outra mulher...

Sei que esse tipo de comentário não é intencionalmente escroto. Mas reflete claramente a ideia de que a homossexualidade é um desperdício sim. Ninguém que eu tenha conhecido nos meus 42 anos de vida se incomodou ao ver uma pessoa atraente do sexo oposto envolvida com uma relação hetero com alguém que não ela própria, a menos que tenha uma paixão realmente forte pela pessoa. Mas com os homossexuais é diferente. Um gay ou uma lésbica atraente é "desperdício". Desperdício de que, porra?

Pois esse é um ponto. A amiga em questão é realmente linda. Aí apareciam caras que nunca arranjavam NADA com esse discurso. "Nossa, que desperdício uma mulher assim ser lésbica". Dava vontade de responder: "gente boa, você não consegue nada com ninguém. Você acha mesmo que a única coisa que te separa dessa nega é o fato de ela ser lésbica? Por que você acha que se ela fosse hetero agiria diferente de todas as demais heteros que não querem nada contigo?"

Pior que no nosso meio esquerdista-acadêmico, esse discurso campeia livremente, de forma acrítica. Ouvimos toda hora mulheres solteiras falando que os únicos homens interessantes são gays. Um discurso pretensamente liberal. Que na verdade é super babaca. Pensam nos gays como um estereótipo de caras cheios de bom gosto que gostam de ir a shoppings fazer compras com elas. Como se uma orientação sexual definisse de forma absolutamente incontornável um conjunto de gostos e atitudes. Besteira pura.

Com as lésbicas é diferente, mas ao mesmo tempo é igual. O estereótipo é diferente, mas é estereótipo também. Ao menos nos cursos de humanas das universidades públicas é comun que mulheres experimentem em algum momento o sexo com mulheres. Então acabamos por cristalizar a ideia de que sexo entre mulheres é só uma brincadeira. Quando alguma assume o fato de que essa é a sua orientação não conseguimos levar totalmente a sério. Quando nos convencemos que é isso, não nos convencemos. Achamos que a lésbica gostosa pode a qualquer momento acordar e ver a "verdade". Talvez falte apenas um cara que faça ela ver que é disso que ela gosta. Se não, é desperdício.

Nisso tudo o que é desprezado, o que não é levado em conta, é a orientação da pessoa, a forma que ela se sente. Não nos perguntamos o que ela pensa quando é vista como objeto acessível a um gênero que não lhe interessa, muito menos o que a pessoa acha quando se vê enquadrada nas posturas citadas acima. Afinal, nisso tudo o outro não importa. Nenhuma das posturas citadas leva em consideração os sentimentos alheios. E nesse sentido são todas iguais.

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