Dia desses um ex-zagueiro da seleção norte-americana de futebol chegou ao Brasil para atuar como comentarista na copa. Tuitou que gostou do aeroporto do Galeão, que pareceu a ele melhor que a maioria dos congêneres de seu país. Um pouco depois fez graça dizendo que estava no Rio há algumas horas e não tinha tido nenhum órgão roubado, evidentemente rindo dos temores de muitos de seus compatriotas que acham que vivemos num mundo de caos e anarquia. Vi esses tuites, ri muito, desejei que o Galeão realmente esteja como ele diz (nas últimas vezes que estive lá achei horrível) e segui a vida.
Para minha surpresa, os tuites de Alexi Lalas viraram tema de debate. Defensores da copa e do governo federal usaram seus comentários sobre o Galeão como prova irrefutável de que o Brasil está uma maravilha e que o evento será ótimo. Oposicionistas e babacas que queriam ser parisienses leram correndo o outro tuíte e bradaram: OLHA O QUE O MUNDO PENSA DO BRASIL.Uma discussão idiota que eu não devia estranhar. Ela acontece aqui o tempo todo.
Não faz muito tempo o segundo grupo exultou com o que um jornalista dinamarquês postou, criticando o país e a copa. O primeiro compartilhou insanamente um e-mai de um suposto holandês que achou o Brasil uma maravilha. Oposicionistas compartilham nas redes sociais um hoax com conselhos que os governantes chineses teriam dado ao Brasil (logo a China, uma ditadura pretensamente socialista, ou seja, tudo o que eles dizem odiar mas endossam quando é de seu interesse), enquanto os governistas compartilham palavras de economistas estrangeiros dizendo que o Brasil é um modelo.
Tudo isso parece conflitante, mas não é. No fundo é a mesmíssima coisa. Tudo isso tem algo em comum: a submissão ao estrangeiro. A superhipervalorização da palavra de quem vive em países desenvolvidos. A premissa de que nada melhor para validar um argumento do que uma citação de alguém que vive num oásis de civilização, bem longe da selvageria tropical. É o que há meio século Nelson Rodrigues chamou de "complexo de vira-latas", sem tirar nem por.
Claro que um olhar de fora pode ser interessante. Os pernambucanos vivem se surpreendendo quando indico peculiaridades da vida local que na opinião deles são "normais". É mais do que razoável apreciar que um outsider desnaturalize algo que para nós é óbvio. Até aí maravilha. Mas na boa: precisar do endosso de gente que mal conhece nosso país para teses sobre quem somos é demais. Chega a ser ofensivo que alguém que nasceu e passou sua vida toda no Brasil ache que sua opinião sobre o país só se torna válida quando corroborada por alguém que mal sabe onde vivemos.
Não é uma questão de direita e esquerda, governo e oposição. É questão de reconhecer que somos mais que habilitados a ter opinião sobre o país em que nascemos e vivemos sem precisar da legitimação de quem mal nos conhece. Sejamos governistas, oposicionistas, direitistas, esquerdistas, o que quisermos. Mas por favor: nenhuma dessas posições necessita ser corroborada por estrangeiros. Quem conhece o país somos nós. Trabalhemos para que a pergunta "o que os estrangeiros vão pensar?" um dia seja tão arcaica como o código de hamurabi.
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