sexta-feira, 13 de junho de 2014

Pátria, Governo e Seleção

Comecemos com uma obviedade: Pátria é uma coisa, Governo é outra e seleção de futebol é outra. Se eu digo uma coisa tão óbvia é porque essa distinção parece não estar muito clara para uma quantidade enorme de pessoas quando se trata da atual copa do mundo. E essa confusão tem gerado discussões insuportáveis repleta de argumentos tolos tanto em veículos da grande mídia quanto na blogosfera quanto nas redes sociais.

Para a oposição à direita, a copa existe para atacar o governo. Dizem que vão torcer contra a seleção, que vão torcer pela Argentina (pura picuinha, já que também detestam o governo argentino, o que confere uma incoerência monstro à pretensa politização da escolha), acham lindo que um bando de gente de alto poder aquisitivo tenha sido tão grosseiro a ponto de mandar a presidente "tomar no cu" (justo eles, tão ciosos da moral e dos bons costumes) e torce insanamente para que tudo dê errado. Se a internet cair por 5 segundos no centro de imprensa de Cuiabá isso prova a incompetência do governo. Querem que o Brasil perca, por acreditar que isso ajudaria a derrotar Dilma em outubro. Bem, se são pessoas minimamente coerentes, espero que tenham torcido loucamente contra a maravilhosa seleção de 1982 para que o governo militar não pudesse capitalizar a vitória canarinho nas eleições de novembro daquele ano.

Nas hostes governistas é tudo ao contrário. Torcem mais do que nunca pela seleção, para que uma grande festa popular pelo título seja a coroação da "copa das copas". Para esses, tudo está lindo, os estádios são maravilhosos, críticas a qualquer aspecto da organização é coisa de coxinha.

A oposição à esquerda é mais complexa. Não está (em termos políticos) muito preocupada com o que acontece no campo. Mas desconfia barbaramente de pessoas que torçam muito pela seleção, pois acham que isso é coisa de governista acrítico ou de pachecos. Seu interesse principal na verdade é no aspecto extra-esportivo: querem mostrar o custo humano da copa e denunciar violência da PM contra os "protestos da população". Aí rola aquele velho patrulhamento que todos os esquerdistas conhecem bem: "como você pode se preocupar com a copa enquanto há tanta seca, enchentes, violência policial, desigualdade, etc.?".

Me desculpem os inúmeros amigos que adotam qualquer uma dessas posturas, mas acho que vocês estão completamente errados. Copa é a coisa mais legal do mundo, acontece só de 4 em 4 anos e desta vez é no Brasil. Será que um dia teremos outra oportunidade de desfrutar de um mundial como o deste ano? Acho pouco provável. Um monte de jogos legais acontecendo aqui dentro, com a presença de muitos dos maiores jogadores do mundo, estrangeiros de todos os tipos, cores e tamanhos circulando pelas nossas cidades, enfim, uma delícia total.

"Ah, mas isso é alienação". Não, não é. Copa não dura 365 dias por ano. Dura 1 mês a cada quatro anos. Me dou o direito de ser alienado nesses dias. Pois nunca vi ninguém que seja politizado 24 horas por dia. E seria mesmo um inferno. Ninguém aguentaria uma pessoa assim. Todos nós temos nossos deveres de cidadãos mas também temos o direito de, quando acharmos necessário, desanuviar a mente com algo, seja futebol, livros policiais, comédias românticas, viagem pra hotel fazenda, enfim, o que achar melhor. Me desculpem, mas não vou ficar o dia todo lutando contra o fim da desigualdade.

Então é o seguinte: vou torcer como sempre pelo Brasil, mas também, em ordem descrescente, por Uruguai (por amor ao país e à mística da Celeste), Russia (velhos hábitos comunistas), Portugal (a boa e velha ancestralidade) e México (que acho que deve ser um país muito legal). A partir do mês que vem volto a fazer minhas escolhas baseado em política. Agora não. Estou preocupadíssimo com a reeleição da Dilma, mas neste minuto exato o que realmente ocupa minha mente é se Luis Suarez ao menos entra no segundo tempo do jogo do Uruguai amanhã. Até a próxima.

4 comentários:

  1. Concordo com vc meu amigo!!! Temos que aproveitar esse momento único! !!

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  3. Discordo em partes de você, Tiago! Porém meus motivos não estão ligados a questões políticas (até por que sou de esquerda e também gosto demais de acompanhar a copa do mundo).
    Minha crítica e descontentamento com a copa do mundo se refere a algo muito mais amplo e atinge todos os megaeventos esportivos (as olimpíadas estão nesse bolo também), e não se restringem somente à ocorrência no Brasil.
    O problema é que tais eventos catalisam aquela lógica escrota de desenvolvimento das cidades orientado pelo poder do capital, das empreiteiras e da especulação imobiliária. Pra que isso venha a se efetivar, são feitas várias remoções forçadas, afetando a população mais pobre, que abusivamente perde suas casas nas localidades que são forçadamente direcionadas para a "valorização", beneficiando as elites em várias direções (grandes empresas que exploram a engenharia e os serviços do entorno, e os ricos que poderão morar e frequentar em tais lugares). Tais remoções não recebem destaque da imprensa, bem como as medidas de segregação social (uma copa feita para as elites, numa cidade cada vez mais moldada para as elites).
    Além disso, sinto nojo de uma entidade como a FIFA (bem como o COI, dentre outros), pois é uma empresa privada, poderosa, que deveria cuidar do desenvolvimento, organização e melhor promoção do futebol, porém se volta exclusivamente para a maximização de seus lucros, por meio de negociatas e exploração comercial.
    Meus motivos de desalento com a copa não têm nada a ver com o discurso dos coxinhas, que berram hipocritamente a respeito da corrupção, mas não se importam com a segregação social (muito pelo contrário). Aliás, foi uma massa de coxinhas estúpidos que xingou a presidente durante o jogo da seleção da Globo/CBF, mesmo representando a parte beneficiada pela copa (possuem poder aquisitivo para irem aos jogos). E tais coxinhas são fanáticos torcedores da CBF, ou seja, eles odeiam a Dilma, acham que o PT inventou a corrupção, mas são doentes pela seleção da arbitragem e torcem desesperadamente pelo hexa, e que venha no roubo mesmo (chegaram a cantar "ahahuhu o juiz é nosso!").
    Infelizmente sou viciado em futebol, e pior ainda quando é copa do mundo. Assim sendo, compartilho do mesmo sentimento teu em desfrutar da copa do mundo. Como sempre faço, assistirei a quase todos os jogos, e estou sempre acompanhando as notícias das seleções (exceto o Brasil, e principalmente meu Uruguai). Mas isso não diminui meu sentimento negativo diante do que a copa e os megaeventos esportivos trazem a reboque (até um evento pequeno como o Pan do rio 2007 foi uma "festa" de segregação social, com a devida omissão da grande mídia).
    Desculpa pelo enorme comentário! Meu pouco poder de síntese é um problema!

    Abraço,

    Moisés Cesar

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