sexta-feira, 4 de maio de 2012

A educação além dos números

Hoje fui a uma reunião de coordenadores de curso de graduação da minha universidade com a Pró-Reitora de Graduação, que se despedia da função, já que tomará posse como reitora na terça-feira. Na reunião ela fez um balanço de seus oito anos no cargo. Só deu números. O termo "qualidade" nem foi mencionado. Por exemplo, mostrou quantos por cento a mais de vagas oferecemos, mas nem se preocupou em mostrar que isso era bom.
A culpa não é dela. Faço ideia de quanto os burocratas de Brasília devem ter aborrecido ela nesses oito anos para que os tais números melhorassem. É a única coisa que importa na educação hoje em dia. O resto é irrelevante.
Por exemplo, tenho notado que o perfil do pós-graduando de hoje é muito diferente de 15 ou 20 anos atrás. Hoje o aluno é muito menos tenso que o de outros tempos. Afinal, não se espera que ele faça uma boa dissertação. Espera-se que ele faça qualquer dissertação. Pois as agências de financiamento só pensam nisso: números.
Por exemplo, em uma certa altura do meu mestrado concluí que o melhor era terminar em dois anos e meio. Tinha tido muitas dificuldades (por exemplo, meu orientador morreu), e achei que ter mais seis meses me daria condições de fazer uma dissertação bem melhor. Não precisei pedir para ninguém, ou fazer sequer um requerimento. Decidi, comuniquei ao orientador, e pronto.
Hoje eu não poderia fazer isso. Só em caso excepcional, e teria de entrar com um pedido justificando de forma incontestável a necessidade de um prazo extra. Se o pedido não fosse aceito, seria simplesmente desligado do programa e pronto. Um aluno que não defende em dois anos rebaixa a pontuação do programa, que não pode se dar a esse luxo.
Não gosto do resultado que vejo. O aluno acaba de alguma forma percebendo que o programa precisa dar um jeito de ele defender o que tiver feito em dois anos. Acaba ficando mais negligente e desinteressado. Não acha indispensável "jogar com sangue nos olhos", como se diz no futebol. À medida que o programa se sente mais e mais responsável por esses alunos, eles vão perdendo a necessidade de correr atrás de tudo o que precisam fazer.
Em suma, vamos lentamente fazendo com que nossos alunos de pós estejam ficando mais e mais preguiçosos. Não se sentem responsáveis. Se o ônibus demorar a passar desistem de ir à aula. Não é culpa deles. Para eles, o mestrado é apenas a continuação da graduação. E estão certos. O modelo atual retira muito da responsabilidade que deveriam ter. Mas como os números estão bons, está todo mundo feliz.

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