terça-feira, 22 de dezembro de 2015

"Ideologia de gênero" mostrando como 2015 foi um ano de ouro

Qualquer pessoa que tenha lido Simone de Beauvoir ou saiba o que é gênero sabe que ninguém defende que não existem homens e mulheres, meninos e meninas. Simone disse algo que hoje soa absolutamente trivial. Que eu nasci com meus órgãos sexuais masculinos, mas que foi a sociedade que me ensinou que esses órgãos significavam que eu deveria gostar de futebol e não de bonecas, por exemplo. Qualquer pessoa com QI minimamente defensável consegue entender isso.

Mas muita gente não entendeu. E não apenas retardados mentais: muita gente boa não conseguiu ver essa obviedade. Pra eles o texto de Simone significa que não existem meninos e meninas, homens e mulheres, que há alguma coisa como uma "ideologia de genero" (aahhahahahahahahah) que diz que homens e mulheres são aberrações da natureza. Algo tão flagrantemente imbecil que deve nos levar à reflexão. Por que tanta gente com cérebro se mostra disposta a acreditar em algo tão idiota?

Tem uma certa coisa de achar que o governo petista é comunista e quer acabar com a família brasileira. Isso é imbecil demais e eu tenho preguiça de discutir. Prefiro falar de outra coisa.

O que existe de fato é um sentimento de que coisas que sempre existiram e são "naturais" estão sendo solapadas. Essa parte eu consigo entender. Todo dia na faculdade vejo alunos meus exibindo sua orientação, outros questionando a dominação masculina, ouço discursos contra a visão de mundo branca, contra a hegemonia do eixo Rio-SP e por aí vai. Não é sempre fácil lidar com tudo isso de uma vez só.

Temos duas opções. A primeira é assumirmos que somos privilegiados e tentarmos entender essa molecada e o que eles querem dizer. Não é um caminho fácil. Fomos jovens e sabemos como gente nova pode ser agressiva e impaciente. Mas eles tem algo que nenhum de nós tem: uma genuína vontade de mudar o mundo. Por mais que sejam às vezes inconsequentes e contraditórios, são os jovens que levam o mundo à frente. Não vou negar que há momentos em que minha filha e meus alunos me fazem sentir no meio de uma avalanche. Mas se alguém vai mudar o mundo, é gente como eles.

A outra opção é nos aferrarmos aos nossos privilégios. Nos agarrarmos a quem odeia todas essas demandas. A quem é e sempre foi privilegiado mas agora resolveu bancar a vítima. Homens brancos heteros carnívoros se sentindo sitiados por mulheres, negros, homossexuais, vegetarianos, e considerando que o que há a fazer é ficar por aí dizendo "tadinho de mim" enquanto endossam ideias que só fazem perpetuar desigualdades.

2015 foi um ano chave. Nele muita gente mostrou sua cara. Gente que passou a vida posando de gente boa teve de sair da casca e berrar em alto e bom som que se sentia coitado por ser privilegiado questionado por quem sempre se ferrou. Quem nunca teve voz falou mais que nunca. Quem sempre falou sozinho se sentiu ofendido. Me digam outro ano em que isso aconteceu com tanta intensidade.

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