A pergunta que está no título do post não é retórica. Parei para pensar sobre isso no último fim de semana. Essas manifestações são absolutamente sem finalidade: todos sabemos que Dilma venceu a eleição e governará o país pelos próximos quatro anos. No entanto elas se repetem, são noticiadas com destaque e não saem da pauta do debate político. Então me pergunto: por que?
Por dois motivos. Um tem a ver com o lado governista, e o outro diz respeito à oposição de direita. Nos dois casos trata-se de o início de embates em busca do protagonismo no ciclo que quatro anos de governo Dilma que está prestes a começar.
Comecemos pelo lado governista. Covenhamos que desde a vitória de Dilma não tivemos uma única boa notícia que seja. Nós, que historicamente militamos à esquerda e nos sentimos representados pelas ações do governo, tomamos uma porrada atrás de outra no período pós eleitoral. Por mais que não queiramos assumir, fomos ao paraíso na noite do dia 26 de outubro, mas depois chegou o inferno. O discurso da vitória da Dilma já apontava nesse sentido, e o que veio depois confirmou nossos piores medos. Não sabemos como serão os próximos quatro anos, mas todas as indicações que tivemos, como a formação do ministério, são de doer.
Então aparecem essas manifestações. Que pretendem prolongar a campanha para um terceiro turno. Nos devolvem àquele mundo confortável em que os ricos querem o PSDB no poder, enquanto o PT faz tudo pelos pobres. Uma dicotomia falsa que nos afasta do pesadelo do mundo real. As pessoas que estão ali de fato não têm senso de realidade e nada mais querem do que defender seus privilégios. Mas qualquer pessoa minimamente esperta sabe: rebater uma verdade com outra verdade é um recurso argumentativo brilhante, mesmo quando vazio. Vociferar contra o elitismo e a demofobia dessas pessoas nada mais é do que uma maneira de esquecermos que até agora Dilma não cessa de fazer coisas que odiamos após vencer as eleições. A existência de grupos de malucos que pedem ditadura militar (convenhamos, são ultra minoritários nessas manifestações) ainda nos dá o bônus de agir como se estivéssemos lutando pela sobrevivência da democracia. O que é uma tolice. Não há chance de golpe. Muito menos com o PSDB na liderança.
Mas também há o lado oposicionista da história. Quem conhece política de perto sabe que a política interna do PSDB é um ninho de cobras. Quem me informa sobre isso é gente que vota no partido desde sempre, inclusive. E é bastante evidente que após a eleição as lideranças tucanas vão buscar o protagonismo oposicionista, o que é muito normal. É o jogo da política. Cada um vai lutar com as armas que tem. E aí entra Aécio. Nunca foi um líder nacional. Não tem qualquer projeto para o país. Mas viveu seu momento de glória ao, pela primeira vez em 12 anos, fazer a oposição disputar com chances de vitória uma eleição presidencial. Natural que queira prolongar o clima de polarização eleitoral que o torna protagonista.
Nesse processo seu antagonista natural é Geraldo Alckmin, que tem uma agenda radicalmente diferente. Como todos os governadores do país, precisa ir ao governo com o pires na mão. Precisa de uma relação menos conflitiva com Dilma para ter a ajuda necessária para governar. Além disso, o governador paulista tem um projeto claro em mente. Para ele, o PSDB precisa trilhar um caminho mais conservador para se diferenciar suficientemente do governo federal. Mas para um projeto assim prosperar é absolutamente indispensável se afastar da extrema direita que defende coisas como o regime militar. Por isso Alckmin se mantém mais distante que Aécio das manifestações. Para Aécio o terceiro turno significa protagonismo. Para Alckmin é um antagonismo desnecessário com uma presidente de quem depende das verbas e o risco absolutamente desnecessário de uma foto tendo por perto uma faixa de algum imbecil defendendo a ditadura militar.
Não sejamos inocentes. Nós, eleitores, lutamos insanamente a favor de nossos candidatos no processo eleitoral deste ano. Eu saí para a rua para defender Dilma, fiz isso nas redes sociais, bloqueei adversários da minha vida, e os que eu amo de verdade eu mantive distância para que relações importantes não fossem prejudicadas pela política. Enfim: eu votei em quem acredito, tanto quanto os que estavam do outro lado. Mas sejamos cuidadosos: há o momento de ir para a rua defender o que acreditamos e há o momento de identificar quando se espera que você seja um ingênuo útil. Sair para a rua para defender o impeachment de Dilma ou argumentar que essas passeatas são uma tentativa séria de golpe é acreditar demais em Papai Noel. Tô fora.
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