terça-feira, 23 de outubro de 2012

O que a educação pode fazer por um país


Tenho me divertido muito com o fato de que, talvez mais do que nunca, os brasileiros olhem com algum interesse para coisas que acontecem no Uruguai. As atitudes do presidente Mujica são vistas com um misto de surpresa com admiração, e mais recentemente as discussões sobre aborto e maconha também tem sido noticiadas por aqui. E isso porque a maioria dos brasileiros nem sabe que o consumo de maconha é legalizado por lá (mas não a venda, o que é um paradoxo) e o aborto já não é criminalizado. Discutem-se ampliações nesses tópicos, mas já estão décadas na nossa frente neles.
Na verdade essas "excentricidades" do país não são algo isolado, se inserindo num contexto mais amplo. O Uruguai sempre foi mais laico que seus gigantescos vizinhos e a América Latina como um todo. O país tem indicadores sociais escandalosamente altos para um país latino-americano, sendo o melhor IDH do continente, muito acima do Brasil. Vale lembrar: isso em um país pequeno, de baixíssimo potencial econômico e que está estagnado economicamente há décadas.
Isso tem muito a ver com o fato de o país ter construído há muito tempo uma rede de proteção aos mais pobres. Você vai a Montevidéu e vê pobreza, claro, é uma capital latino-americana. Mas não vê miséria, gente desassistida, abandonada pelo Estado, como temos de sobra por aqui. A maioria dos prédios não tem garagem: as pessoas deixam o carro na rua mesmo. Os ônibus são excelentes e confortáveis, há parques públicos à vontade para o lazer do fim de semana, de modo que mesmo sem que Montevidéu tenha metrô, eu jamais vi um engarrafamento por lá.
E eu não tenho a mais vaga dúvida de que tudo isso passa pela excelência da educação uruguaia, um país onde cada criança de escola pública tem um notebook (a Argentina adotou isso recentemente também. claro que isso não quer dizer grande coisa, funciona apenas como exemplo de algo maior). Acho que os vizinhos platinos, mas principalmente o Uruguai, são mostras do que a educação pode fazer por um país.
Quem estuda num sistema educacional decente tem muito mais chance de ter autonomia o suficiente para não entregar decisões importantes de sua vida nas mãos de algum religioso obscurantista ou alguma celebridade de TV. Não aceita que o Estado não ofereça a seus filhos uma educação de qualidade. Não olha estrangeiros como bizarros invasores que devem ser temidos ou odiados. É menos propenso a achar uma ditadura uma boa ideia (o país teve suas turbulências, claro, mas perto dos demais países do continente, a história política do Uruguai é de uma calma assustadora).
Ontem conversava sobre isso tudo com um amigo, que como eu é um gaúcho de coração charrua (infelizmente torce para Inter e Nacional, enquanto eu sou Grêmio e Peñarol). E não tivemos dúvida de que a qualidade e a abrangência da educação uruguaia são essenciais para que o país tenha virtudes que seus vizinhos gigantescos e muitíssimos mais ricos não possuem.
Note: o objetivo deste post não é elogiar o Uruguai. Amo o país, sou de mal com Deus por não ter me feito nascer lá, mas a questão não é essa. Inclusive porque, como já disse, é um país latino-americano, com problemas que qualquer morador do continente conhece. O Uruguai não é um paraíso. É apenas um país pobre que se levou a sério o bastante para ter na educação o pilar central de seu projeto nacional.
E por que não fazemos isso aqui? Por que todos nós somos tão conformados com uma educação porcaria? Sinceramente acho que estamos tão mal nesse quesito, mas tão mal, que sequer somos capazes de identificar o problema. Nunca tivemos uma educação de qualidade. Mesmo nossas escolas particulares são de péssima qualidade. Não sabemos o que é educação de qualidade. Não temos ideia do que ela pode fazer por um país. Então não sabemos como ela faz falta. Aí continuamos falando da boca pra fora que precisamos melhorar a educação brasileira, mas sem levar isso minimamente a sério. Falamos, fazemos postagens no facebook dizendo isso, mas não tomamos uma atitude que seja para melhorar. E garantimos a perpetuação de dezenas de problemas gravíssimos do nosso país.

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