Várias pessoas me perguntam por que sou adepto do kirchnerismo. Respondo: não sou kirchnerista na Argentina, apenas acho que a oposição do país é tão bisonha que impede que existam alternativas ao grupo que está no governo. E francamente, essas eleições terminaram de me chegar à mesma conclusão em relação ao lulo-petismo.
Vocês sabem: estou longe de ser fã desse governo que está aí. Entendo que o PT tenha tido de mudar para ganhar viabilidade eleitoral, e que certas mudanças podem ser aceitavelmente descritas como um mal necessário para que o partido não fosse um eterno derrotado. Mas a questão é que o partido mudou a ponto de não mais ver limites em nenhum sentido. Vale tudo.
Tá, mas que diabos a oposição oferece? A oposição à direita não existe de forma orgânica. É um amontoado amorfo, no qual dificilmente se reconhece uma ideologia, salvo nos quadros mais tradicionais do PSDB, comprometidos com o liberalismo. Mas aquele que é o grande partido da oposição também está perdido. Avalia que a população não quer saber do discurso tradicional do partido, e tateia procurando outra opção. Ainda não achou. Para piorar, ainda vê um patético José Serra comandando o partido na marra, impedindo a ascensão de novos quadros que poderiam revitalizar os tucanos.
Fora isso, a oposição à direita do governo é absurdamente patética. Uma mistura de apoiadores da ditadura com um discurso moralista ao velho estilo udenista com religiosos que querem impor um modo de vida medieval a todos, incluindo os que não fazem parte da sua crença. Uma coisa absurda.
A oposição à esquerda infelizmente ainda não saiu da adolescência. Nos últimos 10 anos tentei com todas as minhas forças me aliar com essa gente. Apesar de tudo, ideologicamente minha visão de mundo é mais próxima de partidos como PSOL. Então fiz o que pude para votar neles. Mas sinceramente, cansei. Vejo que eles estão, numa atitude absolutamente maluca, se aproximando dia a dia do discurso da oposição à direita.
Será que essa gente não percebe como é infantil dizer coisas tipo "PT, DEM é tudo a mesma coisa"? Não se dão conta de como essa postura repete a mesma atitude moralista da direita? Quem, em sã consciência, pode negar o fato de que PT, PSDB e DEM são coisas nitidamente diferentes em todos os sentidos? Quem pode ser cego o bastante para se dizer esquerdista e não achar que vitórias do PT são melhores que vitórias dos democratas-tucanos? Mais um pouco e o Plínio diz que prefere o Serra ganhar ao invés do Haddad... epa! já aconteceu!
Façamos assim então. A oposição à esquerda continua brincando de fazer política, assumindo o papel de moralista das redes sociais, criticando tudo e todos. Aí quando chega a hora de criança ir dormir, eles saem de cena sem ninguém notar e deixam os partidos grandes lutarem de verdade para ganhar eleições. É o destino que esse pessoal escolheu para si próprios. Que sejam felizes. Mas não contem comigo.
segunda-feira, 29 de outubro de 2012
sexta-feira, 26 de outubro de 2012
Milton Nascimento 70
Uma das coisas mais chatas do mundo é quando me perguntam por que gosto ou não gosto de um artista ou uma banda. Música não funciona assim. A música te toca ou não. Simples assim. Acho as composições de Mozart geniais, mas 90% delas não me causam qualquer efeito. Por outro lado, a barulheira do Sex Pistols, formada por analfabetos musicais, me cai muito bem.
Milton Nascimento sempre me tocou. O amo desde que a minha memória consegue alcançar. Claro que tecnicamente sua obra é irreparável: canta pra cacete, compõe bem demais e o acompanhamento instrumental sempre é excelente. Mas isso é o de menos. A questão é que por motivos que nunca entendi, suas obras me arrebatam completamente. Principalmente sua obra dos anos 70, que eu acho o supra-sumo do que se fez em sua geração.
Mas quando mudei pra Minas a coisa ficou pior. Me lembro de quando viajava para Mariana para dar minha primeira aula como professor substituto da UFOP. Havia saído de Campinas as 9 da noite, troquei de ônibus em Belo Horizonte as 5 da manhã. Quando acordei já estava chegando ao destino. Vi o sol nascendo por trás das montanhas tão mineiras e pensei: "putz, as músicas do Milton são a trilha sonora dessa paisagem!".
Naquele momento, ocorrido há uns 10 anos, muitas fichas caíram na minha cabeça. Entendi porque todos os mineiros que eu conhecia amavam Milton Nascimento. E entendi sobretudo a intensidade de suas composições. Tudo o que ele compôs em sua vida é Minas Gerais. Mesmo quando não é sobre isso explicitamente (quase nunca é) você vê claramente que ele filtra o universo pela perspectiva mineira. Sei, você que não é mineiro não vai entender. Não dá pra entender mesmo. Só vendo.
Aqueles anos em Minas foram bons demais. Minas me ofereceu todo o afeto e carinho que só os habitantes daquele estado sabem dar. E a trilha sonora daqueles anos sempre foi Milton Nascimento. E vou dizer: poucas coisas nesta vida são tão legais quanto viajar pelas horríveis estradas mineiras ao lado de uma pessoa amada ouvindo Milton Nascimento e contemplando as incomparáveis montanhas que são a paisagem característica do estado. Minas, montanhas, afeto e Milton Nascimento. Tudo se encaixa perfeitamente.
Sim, este é um post completamente subjetivo. Foi uma opção minha. Poderia falar muito sobre a qualidade da música de Milton Nascimento para celebrar seus 70 anos. Sobre a quantidade absurda de músicas maravilhosas que ele fez. Mas preferi apenas agradecer a ele por ter sido a trilha sonora de tantos momentos da minha vida. Desde que me conheço por gente ele é parte essencial da minha vida. E a esta altura acho que posso dizer que será assim enquanto eu viver.
quarta-feira, 24 de outubro de 2012
Cadê o PSDB?
Chegamos a mais uma eleição em que o PSDB sai menor do que entrou. Nas cidades mais importantes do país teve umas poucas vitórias como sócio minoritário, e fica por aí. Quase certamente levará uma surra em São Paulo, com seu nome mais conhecido sendo derrotado por larga margem por um petista desconhecido do eleitorado até o início da campanha. Para um esquerdista como eu, isso pode parecer ótimo. O problema é que isso lentamente pode trazer desdobramentos muito desagradáveis.
Afinal, antes de esquerda e direita vem a democracia. E o PSDB tem um papel enorme a desempenhar na nossa democracia. Governos de tons esquerdistas se espalharam pela América do Sul nos últimos 15 anos, e muitos deles têm enfrentado oposições de matiz francamente golpista. O Brasil foi preservado disso, já que o campo do centro-direita é hegemonizado pelos tucanos, partido que nasceu na oposição à ditadura, portanto um grupo de sólido DNA democrático. Nesses 10 anos como oposição nunca foram santos, mas jamais deixaram entrever qualquer chance de golpismo, como tristemente vemos em países como Venezuela, Bolívia, Equador e Paraguai.
E não tenho a menor dúvida: se a oposição fosse liderada por gente que mamou nas tetas da ditadura e que até hoje não se acostumou aos mais básicos princípios democráticos (digamos, o DEM), o cenário seria outro. Por isso digo: um partido centrista, liberal em suas convicções, e comprometido com a democracia é algo que faz parte da pluralidade democrática. E em uma região em que a democracia nunca foi um valor arraigado, é altamente desejável termos um grupo como esse comandando o arco de centro-direita.
Infelizmente vemos o PSDB perdido. A população aprova majoritariamente o governo federal, e os tucanos concluíram que boa parte de seu antigo eleitorado não quer mais nem ouvir falar em estado mínimo ou privatizações, bandeiras históricas do partido. O que fazer nesse quadro?
Parte substantiva do partido aderiu à histeria moralista, que é um discurso de qualquer oposição de qualquer época (o PT nos anos 90 também fazia isso), mas que tido como único argumento evidencia fortemente a falta de um projeto coerente.
Pior, outros, como José Serra, em uma atitude eleitoreira, adotaram uma postura reacionária que não combina em nada com a história do partido. Tanto em 2010 como em 2012, Serra, quando se viu em dificuldades, se abriu para a direita mais obscurantista, apelando para um discurso que inclui homofobia e demonização do aborto, algo que envergonharia gente como Franco Montoro, fundador do partido e defensor histórico dos direitos humanos durante a ditadura.
A catástrofe disso é a seguinte. Com isso, o PSDB abre mão de seu protagonismo na aliança centro-direitista que comanda, e coloca argumentos da direita mais lunática em primeiro plano. Assim, o que separa pessoas desse segmento do pensamento: "se é assim, dispensemos intermediários, Malafaia presidente!"? Muito pouco, né?
Talvez o grande problema do partido seja a ausência de renovação. A geração que fundou o partido está morta ou em idade avançada. Era a geração da luta contra a ditadura, que defendia um liberalismo racional e culturalmente progressista. A geração de Aécio e Alckmin deveria ter assumido o controle do partido há tempos. Os nomes citados são populares em estados importantes da federação, mas de fato não conseguiram ainda se inserir no debate nacional. Ninguém sabe o que eles pensam sobre os grandes temas brasileiros.
O PSDB está a deriva. Eleitoralmente ainda é forte: não se pode desprezar o poder de fogo do grande partido oposicionista do país. Mas como vive uma crise ideológica, pode ser em breve superado por grupos francamente reacionários, que sabem muito bem o que querem. Se isso acontecer, a oposição será comandada pelo que o país tem de pior. E como a democracia presume a rotatividade do poder, um dia a oposição voltará ao governo. Imagine se quando esse dia chegar ela for liderada por Silas Malafaia?
Por isso eu digo: o PSDB é necessário para a nossa democracia. Não esse PSDB de Serra, mas o de Montoro, FHC e Covas. Que ele possa retornar como um partido solidamente centrista, liberal, democrático e moderno, para manter nossa democracia segura de ideias autoritárias.
terça-feira, 23 de outubro de 2012
O que a educação pode fazer por um país
Tenho me divertido muito com o fato de que, talvez mais do que nunca, os brasileiros olhem com algum interesse para coisas que acontecem no Uruguai. As atitudes do presidente Mujica são vistas com um misto de surpresa com admiração, e mais recentemente as discussões sobre aborto e maconha também tem sido noticiadas por aqui. E isso porque a maioria dos brasileiros nem sabe que o consumo de maconha é legalizado por lá (mas não a venda, o que é um paradoxo) e o aborto já não é criminalizado. Discutem-se ampliações nesses tópicos, mas já estão décadas na nossa frente neles.
Na verdade essas "excentricidades" do país não são algo isolado, se inserindo num contexto mais amplo. O Uruguai sempre foi mais laico que seus gigantescos vizinhos e a América Latina como um todo. O país tem indicadores sociais escandalosamente altos para um país latino-americano, sendo o melhor IDH do continente, muito acima do Brasil. Vale lembrar: isso em um país pequeno, de baixíssimo potencial econômico e que está estagnado economicamente há décadas.
Isso tem muito a ver com o fato de o país ter construído há muito tempo uma rede de proteção aos mais pobres. Você vai a Montevidéu e vê pobreza, claro, é uma capital latino-americana. Mas não vê miséria, gente desassistida, abandonada pelo Estado, como temos de sobra por aqui. A maioria dos prédios não tem garagem: as pessoas deixam o carro na rua mesmo. Os ônibus são excelentes e confortáveis, há parques públicos à vontade para o lazer do fim de semana, de modo que mesmo sem que Montevidéu tenha metrô, eu jamais vi um engarrafamento por lá.
E eu não tenho a mais vaga dúvida de que tudo isso passa pela excelência da educação uruguaia, um país onde cada criança de escola pública tem um notebook (a Argentina adotou isso recentemente também. claro que isso não quer dizer grande coisa, funciona apenas como exemplo de algo maior). Acho que os vizinhos platinos, mas principalmente o Uruguai, são mostras do que a educação pode fazer por um país.
Quem estuda num sistema educacional decente tem muito mais chance de ter autonomia o suficiente para não entregar decisões importantes de sua vida nas mãos de algum religioso obscurantista ou alguma celebridade de TV. Não aceita que o Estado não ofereça a seus filhos uma educação de qualidade. Não olha estrangeiros como bizarros invasores que devem ser temidos ou odiados. É menos propenso a achar uma ditadura uma boa ideia (o país teve suas turbulências, claro, mas perto dos demais países do continente, a história política do Uruguai é de uma calma assustadora).
Ontem conversava sobre isso tudo com um amigo, que como eu é um gaúcho de coração charrua (infelizmente torce para Inter e Nacional, enquanto eu sou Grêmio e Peñarol). E não tivemos dúvida de que a qualidade e a abrangência da educação uruguaia são essenciais para que o país tenha virtudes que seus vizinhos gigantescos e muitíssimos mais ricos não possuem.
Note: o objetivo deste post não é elogiar o Uruguai. Amo o país, sou de mal com Deus por não ter me feito nascer lá, mas a questão não é essa. Inclusive porque, como já disse, é um país latino-americano, com problemas que qualquer morador do continente conhece. O Uruguai não é um paraíso. É apenas um país pobre que se levou a sério o bastante para ter na educação o pilar central de seu projeto nacional.
E por que não fazemos isso aqui? Por que todos nós somos tão conformados com uma educação porcaria? Sinceramente acho que estamos tão mal nesse quesito, mas tão mal, que sequer somos capazes de identificar o problema. Nunca tivemos uma educação de qualidade. Mesmo nossas escolas particulares são de péssima qualidade. Não sabemos o que é educação de qualidade. Não temos ideia do que ela pode fazer por um país. Então não sabemos como ela faz falta. Aí continuamos falando da boca pra fora que precisamos melhorar a educação brasileira, mas sem levar isso minimamente a sério. Falamos, fazemos postagens no facebook dizendo isso, mas não tomamos uma atitude que seja para melhorar. E garantimos a perpetuação de dezenas de problemas gravíssimos do nosso país.
sexta-feira, 12 de outubro de 2012
"Não vivemos uma democracia": criancice ou reacionarismo?
Uma eleição tem o mérito inquestionável de levar as pessoas a falar mais de política. O que é uma coisa ótima: é exatamente esse o espírito da democracia.
Só que eu fiquei bastante assustado com uma tendência que pude observar. Muitas pessoas com as quais conversei pensam que o Brasil não é uma democracia. Vários inclusive usaram o termo "ditadura". Os argumentos eram vários: não se pode falar em democracia quando o voto é obrigatório, a população é conduzida por uma mídia reacionária, não temos total liberdade e muito menos todos os direitos que deveríamos ter, o candidato que votei não ganhou, o sistema proporcional que escolhe os vereadores e deputados é uma droga, etc.
Não vou aqui discutir se essas coisas existem mesmo ou não. Isso é outra história. A questão aqui é outra: o argumento é de uma tolice inacreditável. Todos eles no fundo dizem a mesma coisa: "só existe um conceito de democracia, que é o que eu defendo. Se não for assim, não é democracia". Ora bolas, mas o argumento em si é extremamente autoritário. Por que diabos todos têm de ter o mesmo conceito de democracia que você?
Mas apenas para efeito de discussão aceitemos que todos esses problemas existem. Quer dizer que não vivemos numa democracia? Então chegamos a um absurdo completo: tudo o que não é uma perfeita democracia é ditadura. Vamos testar essa lógica em outro campo. A maioria de nós acredita que sentir empatia por outras pessoas é uma característica típica do ser humano. Mas há pessoas que não tem essa capacidade. Então devemos classificá-los como? Jácarés? Marcianos? Não. São humanos. Imperfeitos como todos os demais. Assim como nenhuma democracia é ou pode ser perfeita.
Esse argumento, geralmente enunciado de boca cheia, com um ar altamente crítico e superior, é extremamente perigoso. Pra começar é uma ofensa monumental a todos os que viveram uma ditadura de verdade, sofreram com ela e lutaram contra ela. Pessoas que muitas vezes pagaram caro para que tenhamos os direitos que temos hoje. Dizer essa tolice vulgariza e tira todo o sentido do que essas pessoas fizeram.
Mas não é só isso. Quando você vem com essa conversa, vulgariza também o termo "ditadura". Que passa a ser o nome de qualquer coisa que você não gostar. Ao adotar essa definição, tudo passa a ser ditadura, já que nada, nem sua própria vida, é como você gostaria que fosse. Então sempre viveremos numa ditadura. Se é assim, qual a diferença de amanhã um bando de malucos tacar os tanques na rua e sair matando todo mundo que pensa diferente deles? Pra quem pensa que vivemos uma ditadura, isso não fará nenhuma diferença, substituiremos uma ditadura por outra, né?
Deixemos de criancice. Vivemos uma democracia sim. Falamos e escrevemos o que quisermos, votamos da maneira que preferirmos e isso é uma conquista monstruosa de gerações anteriores à minha. O sistema não é perfeito e nunca será. Temos de lutar para sempre melhorar. Mas sem essa imbecilidade esquerdista adolescente que quer ser crítica e superior mas no fundo é um poço de reacionarismo.
domingo, 7 de outubro de 2012
Voto
15 de novembro de 1989. A inesquecível primeira vez em que votei. O Brasil era um país bem diferente. Não havia eleições para presidente há 29 anos. O que significava que a maioria da população jamais tinha vivido aquela experiência. Então de certa forma eu tive sorte. A 8 dias de completar 17 anos fazia algo que pessoas de, digamos, 45 anos, nunca tinham feito até então: votar para presidente. Na verdade tive mais sorte ainda, pois era a primeira eleição em que pessoas de 16 anos podiam votar.
Ter estreado como eleitor naquela ocasião foi mesmo muita sorte. Foi uma eleição muito legal, em que havia candidatos para todos os gostos. Mais que isso, aquela eleição foi uma espécie de ponto culminante de uma sequencia de lutas pela redemocratização. Todo mundo queria votar. Os carros tinham plásticos fazendo propaganda dos candidatos, a eleição era discutida em tudo quanto é lugar. Uma beleza.
Eu votava no Aero Clube de Volta Redonda. Naquele dia eu e meu melhor amigo, que também estreava seu título de eleitor, saímos cedo de casa. Fizemos uma boa caminhada pelo meio do mato para cortar caminho, incluindo atividades como saltar sobre valas (quem disse que no interior não existe aventura?) e chegamos lá. Abri aquela cédula enorme (eram mais de 20 candidatos!) marquei o x no meu candidato e depositei o voto na urna com o coração a mil por ora.
Naquele dia eu votei em Leonel Brizola. Natural: meus pais votaram nele, assim como quase toda a minha família, a maioria dos meus amigos, a minha namorada, meus colegas de turma. Volta Redonda era uma cidade operária, com um fortíssimo sindicato brizolista, a atmosfera era essa mesmo. Se era brizolista ou anti-brizolista. Fiquei com a primeira opção. E não me arrependo.
Quando lembro daquele dia ensolarado chego a me chocar com as diferenças na atmosfera política em relação aos dias de hoje. Meus alunos não têm 10% do entusiasmo que eu tinha naquele tempo em relação ao fato de votar. O que evidentemente tem um lado bom. Significa que a democracia para eles é um dado, algo natural. Por esse lado, o Brasil melhorou muito.
Por outro lado eu sinto falta daquele entusiasmo. Daquele engajamento. Acho que todos nós que vivemos aquele momento cometemos um gravíssimo erro. Achávamos que todos os problemas do Brasil eram culpa da ditadura, e que assim que pudéssemos votar tudo se resolveria. Não era bem assim. Somos humanos, votando em candidatos humanos. Não poderíamos ter colocado tanta responsabilidade em nós mesmos.
O resultado foi que descobrimos algo que deveria ser óbvio: nosso voto não era mágico. O Brasil melhorou nesses 23 anos, mas não virou outro país. Ao invés de entender isso, simplesmente nos desiludimos. Concluimos que político não presta e que eleição não muda nada. A amargura contra a política se generalizou.
Quase um quarto de século depois acho que é hora de revermos isso. Votar não é mais uma conquista, é um direito adquirido. Mas não é algo que vai resolver nossos problemas. Talvez seja mais útil ver uma eleição como um momento em que damos nosso recado. Em que temos a oportunidade de ser ouvidos. Menos como uma varinha de condão e mais como um momento em que a sociedade diz o que pensa. Muitas vezes a sociedade não vai dizer o que queremos. O que não quer dizer que ela esteja errada. Aceitar isso também é parte da democracia.
Ter estreado como eleitor naquela ocasião foi mesmo muita sorte. Foi uma eleição muito legal, em que havia candidatos para todos os gostos. Mais que isso, aquela eleição foi uma espécie de ponto culminante de uma sequencia de lutas pela redemocratização. Todo mundo queria votar. Os carros tinham plásticos fazendo propaganda dos candidatos, a eleição era discutida em tudo quanto é lugar. Uma beleza.
Eu votava no Aero Clube de Volta Redonda. Naquele dia eu e meu melhor amigo, que também estreava seu título de eleitor, saímos cedo de casa. Fizemos uma boa caminhada pelo meio do mato para cortar caminho, incluindo atividades como saltar sobre valas (quem disse que no interior não existe aventura?) e chegamos lá. Abri aquela cédula enorme (eram mais de 20 candidatos!) marquei o x no meu candidato e depositei o voto na urna com o coração a mil por ora.
Naquele dia eu votei em Leonel Brizola. Natural: meus pais votaram nele, assim como quase toda a minha família, a maioria dos meus amigos, a minha namorada, meus colegas de turma. Volta Redonda era uma cidade operária, com um fortíssimo sindicato brizolista, a atmosfera era essa mesmo. Se era brizolista ou anti-brizolista. Fiquei com a primeira opção. E não me arrependo.
Quando lembro daquele dia ensolarado chego a me chocar com as diferenças na atmosfera política em relação aos dias de hoje. Meus alunos não têm 10% do entusiasmo que eu tinha naquele tempo em relação ao fato de votar. O que evidentemente tem um lado bom. Significa que a democracia para eles é um dado, algo natural. Por esse lado, o Brasil melhorou muito.
Por outro lado eu sinto falta daquele entusiasmo. Daquele engajamento. Acho que todos nós que vivemos aquele momento cometemos um gravíssimo erro. Achávamos que todos os problemas do Brasil eram culpa da ditadura, e que assim que pudéssemos votar tudo se resolveria. Não era bem assim. Somos humanos, votando em candidatos humanos. Não poderíamos ter colocado tanta responsabilidade em nós mesmos.
O resultado foi que descobrimos algo que deveria ser óbvio: nosso voto não era mágico. O Brasil melhorou nesses 23 anos, mas não virou outro país. Ao invés de entender isso, simplesmente nos desiludimos. Concluimos que político não presta e que eleição não muda nada. A amargura contra a política se generalizou.
Quase um quarto de século depois acho que é hora de revermos isso. Votar não é mais uma conquista, é um direito adquirido. Mas não é algo que vai resolver nossos problemas. Talvez seja mais útil ver uma eleição como um momento em que damos nosso recado. Em que temos a oportunidade de ser ouvidos. Menos como uma varinha de condão e mais como um momento em que a sociedade diz o que pensa. Muitas vezes a sociedade não vai dizer o que queremos. O que não quer dizer que ela esteja errada. Aceitar isso também é parte da democracia.
sexta-feira, 5 de outubro de 2012
E se eu fosse um político de esquerda?
Sou um opositor de esquerda ao lulo-petismo. Acho que nos 10 anos de governo petista houve avanços nada desprezíveis, mas não aprecio nem um pouco o modelo adotado, que a meu ver é muito tímido na redução da desigualdade. Somos muito ruins nesse quesito, e avançando tão lentamente a coisa não vai ficar bem tão cedo.
O diabo é que quando você olha para outros países governados por políticos progressistas não vê nada muito diferente. Os demais governos esquerdistas sul-americanos adotam modelos distintos, mas em linhas gerais não são lá muito diferentes. O mesmo vale para os governantes dos países do Atlântico Norte que pertencem a partidos mais progressistas.
A grande questão é que todo o espectro mais à esquerda falhou clamorosamente em se reinventar após os sucessivos choques dos anos 70 e 80. O socialismo soviético morreu, o Estado de Bem-Estar entrou em colapso, os sindicatos perderam toda a força e a classe trabalhadora está mais preocupada em salvar seus empregos que em lutar por melhorias.
Em suma, os projetos ideológicos do arco esquerdo da política faliram, e sua base social mudou bastante. Era necessário uma reinvenção. Avaliar o que deu errado, manter o que deu certo, adaptar as velhas idéias à nova realidade. Mas isso simplesmente não aconteceu. A esquerda não criou nada de novo nas últimas décadas. Enquanto isso, os neoliberais tomavam o mundo de assalto, com sua receita simples: tirar o Estado de campo.
Assim, os partidos progressistas mundo afora só encontraram uma alternativa: recuperar velhas fórmulas. Em especial o velho populismo latino-americano: políticos carismáticos comandando um arco duvidoso de alianças mas convencendo a população de que a protegerá de uma elite voraz. E não vale só para a América Latina: Obama mesmo não está longe disso.
É possível governar bem assim. Mas este velho militante esquerdista se sente incomodado com o vazio ideológico que impera na esquerda. No entanto, infelizmente é preciso reconhecer que esses políticos não tem opção. Nós, intelectuais esquerdistas, falhamos monstruosamente em reformular as ideologias que embasam nossa visão de mundo (se é que tentamos fazer isso). Assim, só sobrou aos políticos progressistas requentar ideia velha. Nesse caso a culpa não é deles.
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