sábado, 1 de março de 2014

Justiça com as próprias mãos: quem é o ingênuo nessa história?

Se você é contra a lógica do "bandido bom é bandido morto", certamente está cansado de ser chamado de ingênuo. Os defensores do "olho por olho, dente por dente", cada dia mais visíveis, acham que a gente defende "direitos humanos para bandidos", perguntam, cheios de arrogância, "onde estão os defensores dos direitos humanos quando um trabalhador é assassinado?" e terminam concluindo que somos pobres ingênuos.

Trata-se de um discurso muito fácil: sempre existiu e se cristalizou no filme Tropa de Elite, que nos pinta como um bando de riquinhos retardados que não sabem o que é a "vida real" (seja lá o que isso signifique). Bem, não é que eu defenda "direitos humanos para bandidos". Eu sou um democrata. Acho que todos tem os mesmos direitos. Isso inclui os criminosos. Se vivermos numa sociedade que acha que a lei não é importante, estamos à beira do caos. E é exatamente o que essas pessoas querem. Que a lei só valha para alguns.

Mas claro que essas pessoas não pensam em nada disso. Elas são movidas por um desejo absolutamente primitivo e irracional de vingança. Quem se lembra da lei quando o sangue ferve e você só quer que o outro pague na mesma moeda pelo que fez? Eu entendo. Tive um primo maravilhoso que nunca fez mal a ninguém assassinado barbaramente às vésperas de completar 24 anos, com uma vida toda pela frente. Passei semanas tomado pelo desejo de matar os caras. Até me dar conta: eu podia matar um milhão de pessoas. Meu primo não ia voltar. O desejo de vingança passou.

Mas aceitemos, apenas para efeito de raciocínio, essa lógica. Ok, Bolsonaro se elege presidente e garante que a justiça nunca recairá sobre aqueles que matarem criminosos. O que aconteceria? Bem, eu não ia matar ninguém. Nem você. A vida é dura demais, trabalhamos muito, temos gente pra cuidar, mal conseguimos passar algum tempo com as pessoas que amamos. Não íamos sair por aí trocando tiros com criminosos nas nossas horas vagas, certo?

E quem faria isso? Pessoas acostumadas a isso. Policiais desonestos, outros criminosos (exatamente o tipo de gente que amarrou aquele rapaz no poste). Rapidamente se formariam grupos dessas pessoas, especializados em matar "bandidos". Todo esse pessoal que gosta disso aplaudiria, acharia o máximo. Mas claro que essas pessoas não fariam isso pelo bem da sociedade. Fariam para ter alguma vantagem. Matariam o cara que estuprou uma garota de 12 anos, seriam idolatrados e correriam uma sacolinha "para ajudar a gente a garantir a segurança de voces".

Aí vocês já sabem onde isso termina. A matança cresceria, os critérios pareceriam menos e menos razoáveis, até chegar ao ponto em que até aquela apresentadora do SBT desconfiaria profundamente que na verdade os caras estão matando por interesse próprio, incluindo pessoas de ficha impecável. Mas você teria de continuar dando dinheiro assim mesmo, com medo de ser o próximo. Os caras ficariam mais e mais poderosos, diversificariam seus negócios e virariam mafiosos que reinariam em suas comunidades.

Em suma, meu simpático amigo defensor do assassinato de "bandidos perigosos", você está simplesmente dando o primeiro passo para ter uma milícia controlando a sua vida. Quem é o ingênuo agora?

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