Nos anos 1980 eu vivia no interior do estado do Rio de Janeiro. Era uma época politicamente muito agitada. A ditadura estava em seus últimos suspiros, morreu, veio o pavoroso governo Sarney. Mal nos aguentávamos de vontade de finalmente votar para presidente. E no campo da esquerda o que era união contra a ditadura começou a se transformar em aberta divisão na luta para construir uma candidatura vitoriosa em 1989.
Eu vivia em um viveiro brizolista. Se o estado do Rio votou maciçamente em Brizola em 1989 (coisa de 50% dos votos válidos), em Volta Redonda era ainda pior. Tínhamos um sindicato dos metalúrgicos fortíssimo, nacionalmente conhecido pela sua combatividade, e comandado pelo deputado Juarez Antunes do PDT. Passávamos raiva de ver o pessoal do PT criticando o brizolismo pelo personalismo e pela facilidade em tecer alianças questionáveis (o que, pensando bem, é engraçado quando vemos onde o PT foi parar).
Nossa resposta era colar na testa do PT o lema "a esquerda que a direita gosta". O argumento era o seguinte. O PT era um partido sem viabilidade eleitoral. Mas com seu discurso radical, servia para unir a direita contra ele. Ou seja: era um partido que nunca ganharia eleições, e só servia como espantalho para a grande mídia assustar o eleitorado, empurrando-o para os conservadores (a longo prazo, o argumento se mostrou tão falho como o anterior. a história é a rainha da ironia).
Hoje temos a oposição que o governo gosta. Na verdade é mais do que isso. O Brasil tem uma oposição inteira que parece trabalhar pela reeleição de Dilma. Afinal, pensemos. Nas últimas três eleições os candidatos do PT tiveram algo como 45% dos votos no 1o turno e 55% no 2o. Assim, é óbvio que a oposição não tem escapatória: precisa roubar votos que vêm sido dados ao governo desde 2002. Matemática básica.
Mas o que a oposição faz para conseguir isso? Nada. Segue batendo nos mesmos temas de sempre: corrupção, necessidade de diminuir o tamanho do Estado, críticas ao que vê como demagogia do governo, associar o PT à Cuba e ao comunismo, coisas assim. Ou seja: o mesmo que não colou em 2002, 2006 e 2010 será oferecido novamente. A única mudança é que o tom é cada vez mais nervoso e histérico. O que adiantaria muito se cada pessoa pudesse votar quantas vezes quisesse, a depender de sua vontade. Aí sim: os eleitores da oposição, cada dia mais indignados com essa avalanche de ódio, votariam 1 milhão de vezes cada um e Aécio seria eleito. Infelizmente para eles, não é assim.
(parêntesis: essa escalada histérica no debate político não é privilégio da oposição. o governo faz exatamente o mesmo. falei da oposição no parágrafo anterior porque: 1) ela é o tema do post; 2) é ela quem precisa encontrar um novo discurso; o governo já tem o dele, o mesmo que funcionou nas últimas três disputas)
Na verdade ninguém resumiu melhor o problema da oposição do que um velho amigo meu, tucano desde que o PSDB existe: "enquanto a oposição fizer campanha pensando em 1% da população, o PT não vai sair do poder". É bem por aí. Moro em Pernambuco, um estado que deu a Dilma 77% dos votos no 2o turno em 2010. E não vejo nenhum dos temas que a oposição tanto ama explorar sequer fazer cócegas no eleitorado do estado. Simplesmente não diz respeito a eles.
Corrupção? Qualquer idiota sabe que todos os partidos são iguais nesse quesito. Impostos altos? Em um país com tanta pobreza, quem liga para isso, se essas pessoas que mais precisam consideram que suas vidas melhoraram neste governo? Comunismo? Fora os leitores da Veja, quem liga pra isso em 2014? Diminuir o tamanho do Estado? Bem, boa sorte em convencer as classes D e E de que isso é bom para elas.
Um par de meses atrás ouvi um tucano dizendo: "o Haddad aumentou o IPTU dos ricos, e os pobres é que pagam. as lojas dos bairros ricos estão demitindo seus funcionários". Numa frase, a explicitação total da distância entre o discurso oposicionista e o Brasil. Afinal: 1) presume que a política fiscal da maior cidade do país deva ser guiada pelos interesses dos lojistas de classe alta; 2) seguindo o raciocínio, se nas áreas onde o IPTU subiu houve demissões (claro que não há dados dizendo isso, mas sigamos o raciocínio), então nas áreas pobres onde o IPTU diminuiu deveria haver contratações que as compensassem, certo? Não, na cabeça deles pobre não contrata. Só existem empreendedores nos Jardins e a função do governo é ajudá-los para que o Brasil cresça. Boa sorte tentando convencer moradores da periferia das grandes cidades e dos rincões do país de que a vida é assim.
PS: me antecipo dizendo que este não é um post governista falando mal da oposição. se eu fosse tucano o escreveria sem mudar uma vírgula. trato aqui da estratégia e da postura da oposição. e, como democrata que sou (e pra mim isso está acima de preferências político-partidárias), lamento que seja assim. Primeiro porque quanto mais o governo ganhar eleições com facilidade, menos se sentirá cobrado pela sociedade. Em segundo, porque democracia precisa de oposição e alternância de poder. Mas com essa oposição que está aí, esqueçamos isso tudo.
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