terça-feira, 20 de novembro de 2012
Consciência Negra precisa ter dia?
Não gosto da ideia de um dia ou um mês destinado à consciência negra. Não, não sou um branco babaca, escroto e reacionário que diz coisas tipo "e a consciência branca?". Não é isso. Meu trabalho acadêmico em grande parte foi dedicado à causa dos negros, a qual acho que deveria ser absolutamente prioritária na agenda política do Brasil.
Não gosto da ideia porque acho absolutamente ineficaz. Pra começar, na prática esse tipo de coisa tem gerado em grande medida eventos culturais. Aí vamos nós ver espetáculos de samba, capoeira ou maracatu, e saímos de lá com a consciência limpa. Fizemos nossa parte na luta contra o racismo.
Fizemos porra nenhuma. Há décadas o Brasil vê a cultura negra como sendo a cultura brasileira. Em 3 dias chegarei aos 40 anos, e nunca escutei alguém dizer algo vagamente próximo a "samba, capoeira e maracatu são coisas de negros bárbaros, ninguém deveria gostar disso". Essa simplesmente não é uma questão. Difundir cultura negra para combater o racismo simplesmente é oferecer um remédio para uma doença que não existe.
O problema dos negros brasileiros não é serem vistos pelos brancos como seres desprovidos de uma herança cultural. Os milhões de brancos de classe média e alta que vão ao carnaval do Rio, Salvador e Recife, bem como a espetáculos de maracatu, samba e coisas do gênero são prova eloquente disso. Qualquer brasileiro, inclusive os mais racistas de todos, acredita que o Brasil deve muito de sua cultura aos descendentes de africanos. O problema não está aí.
O problema é que os negros brasileiros são muito mais pobres que os brancos. E não me venha com essa de que isso é herança da escravidão. Ela acabou há mais de 120 anos. Depois da Abolição chegaram levas de imigrantes europeus, todos com uma mão na frente e outra atrás, e eles se arranjaram. Mesmo sendo pobres, ignorantes e analfabetos. Os negros não. Isso é fruto de racismo. Somos um país que escolheu ser racista, e que reafirma essa escolha todo santo dia. A propósito, se o problema fosse a escravidão, veríamos uma diferença entre brancos e negros que foi progressivamente sendo reduzida de 1888 pra cá. Mas não foi o que aconteceu. Houve inclusive períodos bem posteriores em que essa diferença aumentou.
Se eu te pedir para imaginar um médico, você pensará numa pessoa branca. Se eu te pedir para imaginar um pedinte, você pensará numa pessoa negra. Aí é que está o grande problema. O estigma da cor. Na nossa cabeça negros estão destinados ao fracasso. O que é tristemente comprovado pelas estatísticas. Aí é que está o problema real. Num triste círculo vicioso. Negros foram maltratados pela sociedade brasileira, ficaram pobres, aí esperamos que eles sempre se dêem mal, ajudando decisivamente para que isso de fato aconteça.
É por aí que temos de lutar. Por ações que tragam resultados. Como as cotas. Precisamos lutar para que os negros tenham melhores condições de vida. Para que paremos de pensar neles como pessoas destinadas ao fracasso. Todo mundo gosta de samba, capoeira e maracatu. Essa é uma questão resolvida. Mas pensar em negros atuando fortemente no mercado de trabalho pelos melhores empregos, disputando cargos conosco, casando com nossos filhos, isso a gente não consegue pensar. É aí que está a luta real. E ela tem de acontecer todos os dias. O resto é piada.
segunda-feira, 19 de novembro de 2012
A nova onda de assassinatos israelenses
Pelo que vejo a nova onda de ações israelenses tem aborrecido bastante um monte de gente. É um tópico que merece reflexão.
Para começar, é importante que aceitemos que não há santos nessa história. Nada do universo pode justificar o terrorismo. Ações premeditadas que tiram a vida de civis sem dar a eles chance de defesa é algo indefensável.
Por outro lado, há muita coisa a ser sublinhada nessa história. Para começar, ninguém no mundo pode negar que estamos falando de uma luta muitíssimo desigual. Israel é infinitamente mais forte que os palestinos nos campos político, militar e diplomático. Não é um confronto entre iguais. Só isso já é um condicionante da maior importância.
Mas há mais. Se há um país que não tem a menor autoridade para condenar o terrorismo esse país é Israel. O país só existe porque os britânicos foram expulsos de lá porque acharam que não valia mais a pena lidar com o terrorismo judeu. Muitos dos nomes mais importantes e mais idolatrados da história de Israel foram terroristas. Por exemplo, Menachem Begin, primeiro ministro do país entre 1977 e 1983, mas que em 1947 havia coordenado um atentado que tirou a vida de 91 pessoas no Hotel King David em Jerusalém. E foi um dos maiores pilares da luta contra o terrorismo palestino. Hipocrisia pura: terrorismo israelense para obter o direito a um Estado pode. Mas os palestinos fazerem o mesmo, não pode. Por que?
Mas como disse, não há mocinhos nessa história. Israel só existe ainda hoje como Estado por ter conseguido se afirmar perante vizinhos hostis. Em 1948, 1956, 1967 e 1973 esses vizinhos tentaram destruir esse Estado. Essa situação, somada ao milênio de perseguições aos judeus, fez com que Israel tenha se fundado na ideia de que era indispensável para o país mostrar que não toleraria nenhum tipo de agressão, sob pena da própria extinção. E temos de aceitar isso: os israelenses negam aos palestinos o direito de existir como Estado, mas se os palestinos tivessem escolha, tampouco aceitariam que Israel existisse.
No fundo a questão que irrita o planeta terra, e com toda a razão, é o absurdo apoio incondicional dos EUA a Israel. A nação mais forte e potente do planeta se divide em todas as questões, menos nessa. A opinião pública norte americana é fortemente pró-israelense, e acha que o governo do país tem toda a liberdade de fazer o que quiser. Esse sim é um absurdo completo. Nenhuma nação no planeta tem essa carta branca.
Mas sabe o que mais me dói? É ver os judeus soltos pelo planeta defendendo qualquer política do governo de Israel, seja ela qual for. Sou brasileiro, amo o Brasil, mas não me sinto minimamente obrigado a defender as políticas de nenhum governo, inclusive o que está no poder, e que conta com meu apoio. Mas muitos judeus do mundo vêem isso de outra forma. Acham que matar civis desarmados é defender a existência do Estado de Israel.
Aí acontece o seguinte. Um amigo judeu italiano se tornou um ex-amigo depois que postei uma foto de mulheres e crianças palestinas mortas no facebook. Para ele eu ataquei Israel. Eu jamais atacaria esse país. Ataco as políticas de um governo. Como critiquei tantas políticas de todos os governos brasileiros que vi. Mas esse é o problema. Quando tantos judeus progressistas compram a ideia de que matar não israelenses é algo que significa a sobrevivência de Israel, é sinal de que há algo muito errado acontecendo. Quando judeus progressistas acham que matar mulheres e crianças é defender a sobrevivência de Israel a gente vê que o conflito está muito, mas muito longe do fim.
domingo, 18 de novembro de 2012
Consequencias do declinio tucano
Sou um comunista com vários amigos tucanos. Alguns deles são grandes amigos. Nós discordamos em um monte de coisas, nos provocamos, mas sempre nos respeitamos. Afinal, o PSDB é um partido que nasceu lutando contra a ditadura. Eles sabem respeitar opiniões diferentes das deles.
Não é só isso. Confesso que eu e meus amigos tucanos concordamos com uns 80% das coisas. Discordamos até a morte em pontos como a função do Estado. Mas estamos totalmente de acordo nas questões fundamentais. Não se surpreendam. Foi o PSDB que colocou todas as crianças brasileiras na escola quando esteve na presidência, e também criou os primeiros programas de renda mínima.
O PSDB é um partido de esquerda? Não. É um partido liberal centrista. Que por muito tempo foi dominante no arco centro-direitista. Isso sempre foi bom para o Brasil. Enquanto os vizinhos tinham uma oposição golpista, o Brasil tinha uma com DNA democrático e frequentemente progressista. Graças a isso não houve nenhuma tentativa de derrubar Lula ou Dilma, algo que muitos governantes do nosso continente tiveram de lidar.
Por isso eu torço tanto para o PSDB continuar forte. Não concordo com a visão de Estado deles. Não quero viver no mundo que eles querem construir. Mas eu quero ter inimigos como eles. Gente que ache que a democracia é o valor supremo. Que veja o mundo fora da lente lunática, religiosa e ditatorial que a oposição de alguns países vizinhos têm.
Em suma, o Brasil precisa do PSDB. Ter um partido assim comandando a direita é importantíssimo para qualquer país, ainda mais para uma nação em que a democracia não é um valor arraigado.Sou esquerdista, mas acho que a democracia está acima de tudo. E o PSDB é importantíssimo para a nossa.
sexta-feira, 16 de novembro de 2012
A volta da ARENA
Ao menos nas redes sociais a possível volta da ARENA como partido político tem causado muito barulho. Mas sinceramente não acho que vá passar daí. Me parece que, ao menos a princípio, esse partido está destinado a fazer muito barulho e não conseguir nada.
Vejam bem: claro que há potencial para um partido assumidamente de direita. A oposição ao governo federal está cada dia mais perdida, o PSDB não sabe mais o que tentar, e é perfeitamente possível que em breve a oposição seja dominada por um discurso francamente reacionário. Quanto a isso não tenho dúvidas. Mas a questão é: essa nova ARENA tem chance de capitalizar esse tipo de voto? Duvido muitíssimo.
Sem querer brincar de futurologia, mas me parece que o futuro da oposição ao governo é algum tipo de discurso moralista, conservador, reacionário até, mas travestido de novidade. Algo como Daniel Coelho, segundo colocado nas eleições aqui do Recife este ano.Um sujeito que tinha um discurso bem parecido com o da UDN golpista dos anos 50/60 mas travestido de novidade. Ou seja: nada de "vamos fechar o congresso", mas sim "vamos criar um jeito novo de fazer política, sem essa roubalheira e essa troca de favores que estão aí". Para completar, um discurso vagamente ecológico, para dar um tom mais claro de novidade.
Acho que há um grande público carente de representantes assim. Gente que defende valores conservadores, que tem um discurso moralista, mas que possua um verniz "moderno". Afinal, no Brasil todos têm vergonha de se definirem como "de direita". Então uma direita que pareça uma renovação poderia cair muito bem. Em suma, estamos prontinhos para um novo Collor. Ao menos enquanto o governo mantiver a atual popularidade ninguém tem chance de desafiar Dilma em 2016. Mas um dia o rodízio de poder chegará, e acho que um tipo com essas características teria mais chance de chegar lá.
Só que essa ARENA nova não tem nada disso. Para começar, é liderada por uma moça que parece sequer saber do que está falando. Uma coisa é um discurso deliberadamente voltado para pessoas burras. Collor fez isso. Outra, bem diferente, é o discurso ser idiota por falta de opção. O primeiro exemplo tem chances de eficácia. O segundo não. Além disso, essa novidade está chamando muita atenção das pessoas que a odeiam. Não tenho notado essa nova ARENA causando qualquer comoção entre as pessoas mais conservadoras.
Mais importante, esse grupo ao que parece não tem um discurso coerente. É vagamente direitista, mas tem dificuldades em ir além da defesa da ditadura. Sei que no fundo muita gente sente falta da ditadura, inclusive gente que nem era nascida na época. Mas não vejo a possibilidade de que pessoas possam sair a rua motivadas por isso. Uma coisa é a saudade dos militares como parte de uma visão reacionária mais ampla. Outra, bem diferente, é ela ser um argumento central. Não cola.
Finalmente, não vejo possibilidades para nenhum projeto político que olhe para trás. Nenhum brasileiro tem qualquer razão para achar que o país já foi melhor do que é. Para não falar que brasileiros não são particularmente fãs de história. Me parece que o futuro da direita está justamente em mostrar que pode renovar o país. Prometer o retorno a 40 anos atrás não me parece muito promissor.
Em tempo, vale notar que nada impede que esse partido aos poucos vá ganhando uma outra cara e se viabilize. Mas do jeito que está agora, vai lutar para sair do traço nas eleições.
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